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Poderoso chefão
Com um recorde de 14 estrelas concedidas pelo prestigioso guia "Michelin", Alain Ducasse defende uma culinária sem excessos e inicia estudo para criar refeições projetadas para viagens espaciais
TERRY DURACK
DO "INDEPENDENT"
Você já deve ter ouvido falar
do restaurante de três estrelas
e do hotel de cinco estrelas.
Agora vai conhecer o chef de 14
estrelas. Prestes a completar 50
anos, Alain Ducasse já acumula
tantas estrelas Michelin que
poderia formar sua própria
constelação. Quando tinha 33
anos, tornou-se o chef mais jovem da história a ter conquistado três. Dezesseis anos depois,
o guia "Michelin 2006" conferiu três estrelas a seu restaurante no Essex House, em Nova
York, fazendo dele o primeiro
chef a dirigir simultaneamente
três estabelecimentos prestigiados com três estrelas -os
outros dois são o Le Louis XV,
em Monte Carlo, e o Alain Ducasse no Hotel Plaza Athénée,
em Paris. Somem-se outros
cinco restaurantes de uma estrela -quatro na França e um
em Mônaco-, e o total de estrelas de Ducasse chega a 14. Ao
mesmo tempo, ele já ergueu
uma rede de hotéis, restaurantes e bistrôs que se estende de
Las Vegas a Tóquio.
A obsessão de Ducasse em fazer o máximo possível de coisas
caberem em sua vida tem sua
origem em 1984, quando ele sofreu um acidente de avião enquanto viajava a Courchevel,
nos Alpes franceses. O avião se
chocou com uma montanha,
matando quatro colegas de Ducasse. Ele, porém, foi atirado
para fora da cabine e sobreviveu. "Isso me ajudou a compreender o que é importante e
o que não é", diz. "Me ensinou a
me afastar da cozinha e abrir
meus olhos para a imensidão
do mundo."
Vestido com elegância impecável, Ducasse mais parece um
diplomata, um empreendedor
global ou um executivo-chefe
de grande empresa do que um
chef. É claro que, na realidade,
ele é as quatro coisas numa só
pessoa. Ele se mostra calmo e
confiante na superfície, mas
suas unhas parecem ser profundamente roídas. "Não sou
estressado", disse certa vez à
revista "Fortune". "Prefiro estressar as outras pessoas."
Ducasse passou a infância na
fazenda de seus pais em Castelsarrasin, no sudoeste da França. "Quando você cresce perto
de galinhas, jardins e feiras, não
pode deixar de criar uma afinidade com alimentos de qualidade", diz. Aos 12 anos, decidiu
que queria ser cozinheiro, possivelmente inspirado por sua
avó. Aos 16, Ducasse iniciou seu
aprendizado num restaurante
local, mas foi apenas quando foi
trabalhar com Alain Chapel
que começou a vislumbrar qual
seria seu destino. Até hoje ele
se refere a Chapel como seu
mestre espiritual. "Chapel me
ensinou a honrar e respeitar os
alimentos básicos e a apresentá-los aos clientes em seu estado mais puro e perfeito."
Sem excessos
Transferido para a Côte d'Azur, Ducasse se tornou o chef
do restaurante do Hotel Juana,
em Juans-les-Pins, onde, em
1985, foi agraciado com duas
estrelas Michelin. Dois anos
mais tarde, foi procurado pelo
Hotel de Paris com a oferta de
assumir o requintado restaurante Louis XV. Num ato de ousadia aparentemente tola, ele
concordou com uma cláusula
do contrato que previa que conquistaria três estrelas Michelin
em quatro anos -tarefa quase
impossível. Ele a cumpriu em
três. E o fez enxugando a "haute
cuisine" francesa e destituindo-a de muitos excessos. Há
menos creme fresco e manteiga
em sua culinária, que dá ênfase
a temperos simples como o
azeite de oliva extravirgem, limão e ervas. "Se minha culinária tivesse que ser definida por
um sabor apenas, seria aquele
do azeite de oliva extravirgem
sutil e aromático", diz. "Para
que esconder o sabor de vegetais recém-colhidos sob um
molho pesado?"
Alguns críticos da época censuraram seu apreço pelos sabores mediterrâneos rústicos,
mas as forças da transformação
estavam de seu lado. Então,
quando o jovem chef se transferiu para o restaurante parisiense de três estrelas previamente
ocupado pelo grande Joël Robuchon, a censura voltou a entrar em ação diante do que os
críticos interpretaram como
ato audacioso de um oportunista. Mas o restaurante Alain Ducasse precisou de apenas oito
meses para conquistar suas
três estrelas.
Quando ele transferiu seu
restaurante parisiense para o
hotel Plaza Athénée, em 2000,
o "Michelin" o agraciou com
sua mais alta honraria depois
de menos de cinco meses de
funcionamento. Mas nem tudo
foram boas notícias. Ao mesmo
tempo, o guia retirou uma estrela do Le Louis XV, apesar do
fato de o chef, o cardápio, os
garçons e os padrões da casa terem permanecido inalterados.
Ducasse acredita que o objetivo
foi lhe enviar um aviso para que
desacelerasse seu ritmo e que o
rebaixamento não refletiu uma
apreciação negativa do Le
Louis XV. "Se o guia "Michelin"
fosse o único do mundo, então
suponho que isso teria sido
preocupante. Mas não é", diz.
Apesar disso, quando a terceira
estrela foi devolvida à casa, em
2003, ele admite ter sentido
que uma injustiça tinha sido
corrigida.
Livros, hotéis, loja...
Não se sabe bem como, Ducasse também encontrou tempo para adquirir três hotéis rurais, um na Provença, um no
País Basco e um na Toscana.
Ele também é presidente do
grupo hoteleiro Châteaux et
Hôtels de France e preside um
centro de treinamento industrial, uma escola de culinária e
uma editora, a Les Editions
d'Alain Ducasse. E será que me
esqueci de dizer que ele escreveu 16 livros de receitas e abriu
uma loja de comida on-line
(www.ducasse-online.com)?
Aventurando-se no desconhecido, Ducasse vem trabalhando com a Agência Espacial
Européia para criar refeições
embaladas a vácuo projetadas
para condições extremas tais
como as viagens espaciais, ao
mesmo tempo em que cria receitas baseadas em nove ingredientes que a agência acredita
que poderiam ser cultivados
em estufas em Marte. Ele deve
saber que dentro em pouco vão
se esgotar suas oportunidades
de conseguir mais estrelas Michelin aqui na Terra.
Tradução de Clara Allain
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