São Paulo, domingo, 02 de julho de 2006

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BIA ABRAMO

O olho mágico da TV na Copa

Consegue-se decupar cada jogo em flagrantes precisos com uma textura quase carnal

A VISIBILIDADE máxima é uma das características do ambiente hipercomunicacional em que vivemos; mas no olhos dos outros, é sempre refresco. Na Copa do Mundo, queremos espetáculo, é claro, porque é justamente o que promete a tal da mídia (se é que existimos, esta coluna incluída, assim, com um simples artigo definido na frente): imagens e imagens para satisfazer a bestialidade do consumo.
E também queremos sentidos, sentidos e mais sentidos. Não é esquisito que um esporte tão "masculino" quanto o futebol suscite tanta falação, coisa do terreno "feminino"? Desde os comentários ali, na narração mesma, aos intermináveis debates e mesas-redondas e entrevistas, a fruição primeira e primária do jogo em si não prescinde dos julgamentos, das interpretações e da estetização dada pela palavra.
Não há limite nessa promessa, assim como não há limite nessa fome de consumo de imagens e de sentidos. Há sempre algo mais a oferecer, sempre algo mais a demandar. Por exemplo, as câmeras desta Copa têm o olhar mais atento, mais íntimo do que em Mundiais anteriores. Não à toa, o discurso da emoção se concretiza: de fato, com imagens tão límpidas e as possibilidades de aproximação, consegue-se decupar cada jogo em milhares de flagrantes precisos, com uma textura quase carnal.
Foi isso que possibilitou, por exemplo, uma idéia divertida do "Fantástico" de revelar a intimidade dos jogadores fazendo a leitura labial da conversaiada que rola em campo.
É uma coisa a qual todo espectador de futebol especula, ora porque se adivinha facilmente ; ora porque se escondem na medida exata para provocarem a curiosidade.
Não deixa de ser curioso que um dos poucos momentos de despreocupação da cobertura, em que se pretendeu simplesmente responder "o que raios os jogadores e os treinadores falam na nossa frente para que a gente não ouça", tenha causado a irritação de Parreira e um subseqüente pedido descabido de desculpas por parte da Globo.
Paranóico, Parreira classificou a brincadeira como invasão de privacidade. Embora se deva admitir que possa haver algo de incômodo para quem é dessa forma desvendado, não há como o técnico da seleção brasileira de futebol advogar privacidade justamente quando está cumprindo sua função pública.(E o pedido de "desculpas", nesse caso, parece bem inapropriado.)
O que incomoda, de fato, é o excesso de intimidade, quando vem quase que sem mediação. Mas quem diz onde está o limite?


biabramo.tv@uol.com.br

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