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BIA ABRAMO
O olho mágico da TV na Copa
Consegue-se decupar
cada jogo em flagrantes
precisos com uma
textura quase carnal
A VISIBILIDADE máxima é uma
das características do ambiente hipercomunicacional
em que vivemos; mas no olhos dos
outros, é sempre refresco. Na Copa
do Mundo, queremos espetáculo, é
claro, porque é justamente o que
promete a tal da mídia (se é que existimos, esta coluna incluída, assim,
com um simples artigo definido na
frente): imagens e imagens para satisfazer a bestialidade do consumo.
E também queremos sentidos,
sentidos e mais sentidos. Não é esquisito que um esporte tão "masculino" quanto o futebol suscite tanta falação, coisa do terreno "feminino"?
Desde os comentários ali, na narração mesma, aos intermináveis debates e mesas-redondas e entrevistas, a
fruição primeira e primária do jogo
em si não prescinde dos julgamentos, das interpretações e da estetização dada pela palavra.
Não há limite nessa promessa, assim como não há limite nessa fome
de consumo de imagens e de sentidos. Há sempre algo mais a oferecer,
sempre algo mais a demandar. Por
exemplo, as câmeras desta Copa têm
o olhar mais atento, mais íntimo do
que em Mundiais anteriores. Não à
toa, o discurso da emoção se concretiza: de fato, com imagens tão límpidas e as possibilidades de aproximação, consegue-se decupar cada jogo
em milhares de flagrantes precisos,
com uma textura quase carnal.
Foi isso que possibilitou, por
exemplo, uma idéia divertida do
"Fantástico" de revelar a intimidade
dos jogadores fazendo a leitura labial
da conversaiada que rola em campo.
É uma coisa a qual todo espectador
de futebol especula, ora porque se
adivinha facilmente ; ora porque se
escondem na medida exata para
provocarem a curiosidade.
Não deixa de ser curioso que um
dos poucos momentos de despreocupação da cobertura, em que se
pretendeu simplesmente responder
"o que raios os jogadores e os treinadores falam na nossa frente para que
a gente não ouça", tenha causado a
irritação de Parreira e um subseqüente pedido descabido de desculpas por parte da Globo.
Paranóico, Parreira classificou a
brincadeira como invasão de privacidade. Embora se deva admitir que
possa haver algo de incômodo para
quem é dessa forma desvendado,
não há como o técnico da seleção
brasileira de futebol advogar privacidade justamente quando está cumprindo sua função pública.(E o pedido de "desculpas", nesse caso, parece
bem inapropriado.)
O que incomoda, de fato, é o excesso de intimidade, quando vem quase
que sem mediação. Mas quem diz
onde está o limite?
biabramo.tv@uol.com.br
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