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CRÍTICA DRAMA
Adaptação de Dostoiévski vira exercício de oratória
Dramaturgia derrapa na complexidade do texto e não favorece sua compreensão
LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA
Literatura ou retórica? "O
Grande Inquisidor" transpõe
para a cena trecho do romance "Os Irmãos Karamázov"",
de Fiódor Dostoiévski.
A verve filosófica do escritor ilumina, mas não forja
um espetáculo que brilhe por
suas próprias luzes.
O encenador e adaptador,
Rubens Rushe, criador de antológicas montagens de Beckett, volta-se agora para Dostoiévski, recortando de seu livro mais famoso a fábula narrada por Ivan Karamázov ao
irmão Aliócha.
A ação se passa em Sevilha, no século 16. O protagonista é um cardeal que vem
acendendo fogueiras diárias
para queimar os hereges.
Até que aparece um estrangeiro visto pela população como o Cristo retornado,
pois realiza milagres.
O inquisidor manda prendê-lo, visita-o em sua cela e
lhe faz uma longa preleção,
rejeitando sua presença e
tentando provar-lhe como a
Igreja Católica não precisa
mais de ideias libertárias.
MONOTONIA
Na adaptação de Rushe,
que assume a lenda como um
fato histórico, um letreiro
contextualiza a trama antes
do início do discurso.
Como não há diálogo possível, pois o personagem do
Messias permanece mudo,
ainda há sinais de uma teatralidade à Beckett.
A diferença é que, aqui, a
fala proferida fecha um sentido ou tenta construir uma tese. A caudalosa e inflamada
peroração sustenta-se unicamente no desempenho de
Celso Frateschi.
Ator experiente e maduro,
Frateschi encarna com paixão esse homem de noventa
anos que, diante do suposto
filho de Deus, revela os aspectos demoníacos da instituição religiosa.
Porém, por mais enfática e
modulada que seja sua elocução, ela não dá conta da
complexidade das ideias que
estão em jogo.
O raciocínio proferido, que
se combina no romance a comentários intercalados à narrativa pelos dois irmãos, é
tortuoso e, mesmo numa leitura, é difícil acompanhá-lo.
Apreender seu conteúdo
na encenação dependeria do
milagre da alquimia teatral,
mas a dramaturgia proposta
não favorece que ele ocorra.
Nem a precisão corporal
dos atores, nem a meticulosa
iluminação alcançam superar esse impedimento.
O espetáculo se acomoda
como um exercício de oratória, em que mesmo o pretendido embate ideológico sucumbe à monotonia.
O GRANDE INQUISIDOR
QUANDO sex. e sáb., às 21h30,
e dom., às 20h; até 12/9
ONDE teatro Ágora,
r. Rui Barbosa, 672, Bela Vista,
tel. 0/xx/11/3284-0290
QUANTO R$ 30
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO regular
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