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ARTIGO
A disputa pelos pobres na TV
ESTHER HAMBURGER
CRÍTICA DA FOLHA
FOI-SE O tempo em que a pobreza e a violência estavam
excluídos da mídia, que pasteurizava o noticiário e a ficção, representando um Brasil "ideal", branco, pacífico e endinheirado.
O filme "Cidade de Deus", de
Fernando Meirelles, vem suceder
"Palace 2", experimento televisivo
do diretor, que a Rede Globo levou ao ar na estréia de "Brava
Gente", em 2000, e estimula uma
polêmica sadia.
Em uma época em que dificilmente uma imagem une o país,
bairros e pessoas pobres estão cada vez mais visíveis na televisão
brasileira. O rompimento do tabu
da invisibilidade gera disputa pelo
controle da representação. O que
representar, como representar
-e de quem é o controle da representação?
Desde que o "Aqui Agora" buscou assuntos nos bairros pobres
de periferia, mudando o conceito
de notícia do telejornalismo convencional para incluir casos de estupro, brigas familiares e de vizinhos, diversos programas popularescos de fim de tarde imitaram
a receita de "realidade", que inclui
pobres, mas como representantes
da barbárie.
Programas como "Cidade Alerta" ou "Repórter Cidadão" -esse
ainda com o agravante de um título que engana- reforçam a associação sensacionalista entre miséria e violência.
Mas talvez pela primeira vez na
história da ex-colônia portuguesa
os próprios pobres, mais alfabetizados e com a cidadania de consumidores conquistada no mercado publicitário, se arvoram a
participar desse debate. E marcam sua presença com uma radicalidade que faz diferença já por
existir.
O hip hop canta a denúncia da
exploração. A chamada "literatura marginal" arrisca a entrada daqueles que durante séculos carregaram o estigma da ignorância no
mausoléu dos letrados.
Nessa expressão escrita, a televisão é associada a um universo excludente que se quer superar. "A
intenção é mostrar a verdadeira
cara da minha terra, sem inverdades, maquiagens, cenas de novela", diz Gato Preto, em um poema
publicado pela revista "Caros
Amigos". E qual será a cara dessa
terra?
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