São Paulo, segunda-feira, 02 de setembro de 2002

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ARTIGO

A disputa pelos pobres na TV

ESTHER HAMBURGER
CRÍTICA DA FOLHA

FOI-SE O tempo em que a pobreza e a violência estavam excluídos da mídia, que pasteurizava o noticiário e a ficção, representando um Brasil "ideal", branco, pacífico e endinheirado.
O filme "Cidade de Deus", de Fernando Meirelles, vem suceder "Palace 2", experimento televisivo do diretor, que a Rede Globo levou ao ar na estréia de "Brava Gente", em 2000, e estimula uma polêmica sadia.
Em uma época em que dificilmente uma imagem une o país, bairros e pessoas pobres estão cada vez mais visíveis na televisão brasileira. O rompimento do tabu da invisibilidade gera disputa pelo controle da representação. O que representar, como representar -e de quem é o controle da representação?
Desde que o "Aqui Agora" buscou assuntos nos bairros pobres de periferia, mudando o conceito de notícia do telejornalismo convencional para incluir casos de estupro, brigas familiares e de vizinhos, diversos programas popularescos de fim de tarde imitaram a receita de "realidade", que inclui pobres, mas como representantes da barbárie.
Programas como "Cidade Alerta" ou "Repórter Cidadão" -esse ainda com o agravante de um título que engana- reforçam a associação sensacionalista entre miséria e violência.
Mas talvez pela primeira vez na história da ex-colônia portuguesa os próprios pobres, mais alfabetizados e com a cidadania de consumidores conquistada no mercado publicitário, se arvoram a participar desse debate. E marcam sua presença com uma radicalidade que faz diferença já por existir.
O hip hop canta a denúncia da exploração. A chamada "literatura marginal" arrisca a entrada daqueles que durante séculos carregaram o estigma da ignorância no mausoléu dos letrados.
Nessa expressão escrita, a televisão é associada a um universo excludente que se quer superar. "A intenção é mostrar a verdadeira cara da minha terra, sem inverdades, maquiagens, cenas de novela", diz Gato Preto, em um poema publicado pela revista "Caros Amigos". E qual será a cara dessa terra?



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