São Paulo, segunda-feira, 02 de setembro de 2002

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MÚSICA

Cantor paulista lança 41º álbum em 38 anos, enquanto continua a cumprir rotina de shows semanais Brasil afora

Jair lança novo disco em moto-contínuo

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Aos 63 anos, o cantor paulista Jair Rodrigues segue uma rotina peculiar entre músicos que, como ele, não ocupam mais vitrine de frente na mídia. Lança agora, pela Trama, o 41º disco de sua carreira, enquanto mantém sextas, sábados e domingos de shows em moto-contínuo.
Segue um roteiro que se pode dizer alternativo, mas que o põe em contato com o "grande Brasil" e lhe dá "por onde tirar dinheiro para pagar as contas".
"O ritmo de que mais gosto é o samba, mas segui o conselho que me davam os mais antigos, como Orlando Silva, Ataulfo Alves e Silvio Caldas, de que é importante ser eclético. Não tenho problemas, sou chamado para festa de seresta, de peão de boiadeiro, pagode, sambão, escola de samba, aniversário de clube...", relata.
Talvez por isso privilegie a veia de crooner eclético em "Intérprete", produzido por seu filho Jair Oliveira, no qual unifica em seu vozeirão sambas célebres, canção de protesto, forró de Luiz Gonzaga e samba-rock.
Também possivelmente sob o status de sobrevivente, sedimenta no CD a tendência a mirar foco em referências à grande galeria de músicos que saíram do primeiro plano do mercado musical.
Isso se dá na seleção de repertório, pela qual resgata Sérgio Ricardo ("Zelão"), Billy Blanco ("Banca do Distinto"), João Nogueira e Paulo César Pinheiro ("Mineira", em homenagem a Clara Nunes), e por referências indiretas, quando ressalta que "Meu Guarda-Chuva" foi composta por Jorge Ben para ele, mas lançada pela cantora de samba-rock Elizabeth Viana.
Transparece em parte da extensa lista de convidados -o histórico Jongo Trio que acompanhou a dobradinha Jair/Elis Regina nos 60, o colega crooner José Domingos, até o neomaldito Lobão (em "Incompatibilidade de Gênios", de João Bosco e Aldir Blanc).
Jair diz que nada é de propósito, e enfrenta a rixa atual de Lobão com as gravadoras: "Vejo isso acontecer desde Juca Chaves, que foi o primeiro a lutar pela numeração e saiu bastante machucado da história. Não pensei nesse lado ao chamar Lobão, mas, se sua presença servir para eles esquecerem um pouco esse outro lado, quem vai ficar feliz sou eu".
Quanto à adesão tardia ao samba-rock, diz que gravou o gênero quando o nome ainda nem existia, nos anos 60. ""Rapaz da Moda", de Evaldo Gouveia e Jair Amorim, tinha esse estilo, e foi um sucesso no programa "Jovem Guarda", de Roberto Carlos."
Jair integrava com Elis a facção bossa nova da TV dos anos 60 (no programa "Fino da Bossa"), mas diz que mesmo assim tinha livre trânsito na frente iê-iê-iê. E diverge da história ao dar versão extramusical à disputa entre os adeptos da MPB e a turma das guitarras: "Uma vez era para Jorge Ben gravar o "Fino da Bossa", mas acho que ele veio e gravou o "Jovem Guarda" antes. Elis ficou chateada, cancelou sua participação, deixou ele na geladeira um tempo. Era bem coisa de ciúme".
Hoje, Jair se diz surpreso com o entusiasmo dos jovens por seus proto-raps "Deixa Isso pra Lá" e "Ziguezague" (regravada agora com intervenções de Rappin Hood, Simoninha e Jairzinho), sentido em eventos como o "Rock in Rio 3" e o recente VMB.
"Quando cheguei ao Credicard Hall para a festa da MTV, fui muito mais aplaudido que a garotada. Não sei qual é o segredo. Acho que sempre procurei ser honesto, na música ou na vida particular. Não faz coisa errada, não, porque, Nossa Senhora, aquela telinha mostra tudo", encerra.



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