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"Quem fala do corpo fala da morte"
Escritor húngaro Péter Esterházy ganha primeira tradução no Brasil de livro que celebra as alegrias da carne
Em "Uma Mulher", autor fragmenta em 97 episódios encontros amorosos cheios de escatologia e humor
JULIANA VAZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
É entre o goulash, os abscessos e o travesseiro que se
dão as relações amorosas
descritas no primeiro livro do
húngaro Péter Esterházy, 60,
editado no Brasil.
Em "Uma Mulher" este escritor de origem nobre (seu
avô foi primeiro-ministro do
Império Austro-Húngaro),
autor de mais de 30 títulos,
relata em 97 episódios os encontros entre um homem e
uma mulher. Ou várias.
Ora ruiva, ora loira, mas
quase sempre feia, não se sabe quem e quantas elas são.
"O importante é se ela ama
ou odeia", diz à Folha Esterházy, matemático por formação e vencedor do Prêmio da
Paz na Feira do Livro de
Frankfurt em 2004. A seguir,
trechos da entrevista.
Folha - "Harmonias Celestes"
é considerada sua maior obra
e se baseia na história de sua
família. Quão autobiográfico
é "Uma Mulher"?
Péter Esterházy - Não quero me esquivar quando digo
que tudo é autobiográfico e
nada é autobiográfico. Se a
pergunta sugere que minha
vida é escandalosa, então tenho que dizer que nada é autobiográfico. Mas em minha
vida fui apaixonado pelo menos por uma mulher, com
quem também dormi. Muitas
das minhas frases cresceram
dessa experiência.
Por que 97 capítulos? O senhor deve saber, como matemático, que faltam três para
um número redondo.
Não quis escrever 100,
nem 99 ou 101, porque mostraria apenas que eu não queria os 100. Sempre respondo
que peguei o maior número
primo de dois dígitos.
Chico Buarque, um dos artistas mais importantes do Brasil, escreveu que o húngaro é
"a única língua que o diabo
respeita". É verdade?
Completamente. A língua
húngara é única, ninguém
além de nós nos entende. Até
então eu achava que fôssemos anjos, mas o colega
Buarque deve saber mais. Alguns diabos foram anjos.
Um tom cômico atravessa todas as histórias. Quanta ironia cabe no amor?
Não muita, acho. Há no livro descrições radicais do
corpo feminino, que não são
bonitas, porque as mulheres
são gordas, têm manchas na
pele. Quem fala do corpo fala
imediatamente da morte.
Mas há ainda a parte alegre,
que apenas os sentidos podem dar.
O livro foi escrito em 1995. Como o senhor o avalia hoje?
Talvez eu não deva dizer
isto, mas meus livros escritos
não me interessam. Apenas
os que ainda não escrevi me
ocupam. Tenho uma relação
tranquila com os livros antigos. Na época fiquei muito
contente com "Uma Mulher". E hoje ainda estou.
UMA MULHER
AUTOR Péter Esterházy
TRADUÇÃO Paulo Schiller
EDITORA Cosac Naify
QUANTO R$ 43 (184 págs.)
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