São Paulo, sábado, 02 de outubro de 2010

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"Quem fala do corpo fala da morte"

Escritor húngaro Péter Esterházy ganha primeira tradução no Brasil de livro que celebra as alegrias da carne

Em "Uma Mulher", autor fragmenta em 97 episódios encontros amorosos cheios de escatologia e humor

JULIANA VAZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

É entre o goulash, os abscessos e o travesseiro que se dão as relações amorosas descritas no primeiro livro do húngaro Péter Esterházy, 60, editado no Brasil.
Em "Uma Mulher" este escritor de origem nobre (seu avô foi primeiro-ministro do Império Austro-Húngaro), autor de mais de 30 títulos, relata em 97 episódios os encontros entre um homem e uma mulher. Ou várias.
Ora ruiva, ora loira, mas quase sempre feia, não se sabe quem e quantas elas são. "O importante é se ela ama ou odeia", diz à Folha Esterházy, matemático por formação e vencedor do Prêmio da Paz na Feira do Livro de Frankfurt em 2004. A seguir, trechos da entrevista.

 

Folha - "Harmonias Celestes" é considerada sua maior obra e se baseia na história de sua família. Quão autobiográfico é "Uma Mulher"?
Péter Esterházy
- Não quero me esquivar quando digo que tudo é autobiográfico e nada é autobiográfico. Se a pergunta sugere que minha vida é escandalosa, então tenho que dizer que nada é autobiográfico. Mas em minha vida fui apaixonado pelo menos por uma mulher, com quem também dormi. Muitas das minhas frases cresceram dessa experiência.

Por que 97 capítulos? O senhor deve saber, como matemático, que faltam três para um número redondo.
Não quis escrever 100, nem 99 ou 101, porque mostraria apenas que eu não queria os 100. Sempre respondo que peguei o maior número primo de dois dígitos.

Chico Buarque, um dos artistas mais importantes do Brasil, escreveu que o húngaro é "a única língua que o diabo respeita". É verdade?
Completamente. A língua húngara é única, ninguém além de nós nos entende. Até então eu achava que fôssemos anjos, mas o colega Buarque deve saber mais. Alguns diabos foram anjos.

Um tom cômico atravessa todas as histórias. Quanta ironia cabe no amor?
Não muita, acho. Há no livro descrições radicais do corpo feminino, que não são bonitas, porque as mulheres são gordas, têm manchas na pele. Quem fala do corpo fala imediatamente da morte. Mas há ainda a parte alegre, que apenas os sentidos podem dar.

O livro foi escrito em 1995. Como o senhor o avalia hoje?
Talvez eu não deva dizer isto, mas meus livros escritos não me interessam. Apenas os que ainda não escrevi me ocupam. Tenho uma relação tranquila com os livros antigos. Na época fiquei muito contente com "Uma Mulher". E hoje ainda estou.

UMA MULHER

AUTOR Péter Esterházy
TRADUÇÃO Paulo Schiller
EDITORA Cosac Naify
QUANTO R$ 43 (184 págs.)


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