|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Beethoven & Freire
Com novo disco em que interpreta o mestre alemão, Nelson Freire diz que apresentará "programa-surpresa" em São Paulo, depois de tocar no Municipal do Rio
IRINEU FRANCO PERPETUO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Nelson Freire está com disco
novo de Beethoven no mercado
(leia mais abaixo), mas nem ele
sabe o que vai tocar no recital
de lançamento no Auditório
Ibirapuera, dia 9, já com ingressos esgotados. "Pediram-me
um programa-surpresa. Vai
acabar sendo surpresa para
mim também, já que posso decidir só na hora", diz.
O pianista falou à Folha por
telefone, de Paris, às vésperas
de embarcar para o Brasil. No
sábado, interpretou, no Théatre des Champs-Elysées, na capital francesa, à frente da Orquestra de Estrasburgo, dirigida pelo alemão Marc Albrecht,
o mais recente item de sucesso
de sua discografia -o segundo
concerto para piano e orquestra, de Brahms.
"Foi uma festa aqui na rua,
porque a Martha [Argerich,
pianista argentina, sua amiga
há cinco décadas] também tocava no mesmo horário", conta. "Não pudemos ir ao concerto um do outro, mas ficamos
em casa, depois, até 4h, vendo
filmes e tomando champanhe."
O mais provável é que o repertório da apresentação em
São Paulo mescle os itens que
Freire executa no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, nos
dias 5 e 7. No domingo, ele interpreta a sonata "Waldstein",
de Beethoven, mais uma seleção que inclui o "Prelúdio, Coral e Fuga", de César Franck. Já
a apresentação de terça-feira
traz a "Sonata Opus 110", de
Beethoven, as "Cenas Infantis", de Schumann, e ainda uma
série de obras de Chopin.
"Como dizia o pianista Arthur Rubinstein, montar um
programa é como organizar um
cardápio", compara Freire. "A
gente escolhe uma peça que
queira tocar -no caso, as sonatas de Beethoven, por causa do
disco- e, depois, vê o que vai
bem junto."
Inspirações
Rubinstein foi também sua
inspiração na idéia de executar
programas distintos em recitais próximos, na mesma cidade. Um dos passatempos do
saudosista Freire é folhear livros com a história do Teatro
Municipal do Rio de Janeiro e
comparar o passado e o presente da vida musical da cidade.
"Nos anos 20 e 30, pianistas
como o Rubinstein e o Brailowsky, quando visitavam o
Brasil, ficavam um tempão por
aqui e tocavam 17 programas
diferentes", conta. "Foi uma
realidade que eu cheguei a conhecer. Hoje, isso não mais
existe. Com as facilidades do
avião, acabou-se o tempo das
pessoas", avalia.
Outro pianista da primeira
metade do século passado, o
austríaco Artur Schnabel parece ter sido a inspiração principal de Freire no seu recém-lançado álbum, que traz as sonatas
"Waldstein", "Les Adieux", "Ao
Luar" e "Opus 110", de Beethoven (veja, no quadro ao lado, as
gravações preferidas de Nelson
Freire). Um pioneiro, que praticamente criou a tradição moderna de interpretar as sonatas
de Schubert nas salas de concerto, Schnabel já foi chamado
por especialistas de "o pianista
que inventou Beethoven".
"Schnabel é o meu pianista
preferido neste repertório, e ele
toca bem mais rápido do que a
falsa tradição que se firmou depois", afirma. "As críticas da
época dizem que Beethoven,
como pianista, às vezes tocava
tão rápido que as orquestras tinham dificuldade em acompanhá-lo. Esse caráter fogoso e
cheio de vitalidade é o que penso estar mais em acordo com o
espírito da obra."
Freire em discos
A carreira fonográfica de
Nelson Freire começou a virada em 1998, quando ele foi o
único brasileiro escolhido para
integrar "Great Pianists of the
20th Century", ambiciosa coleção da Philips que pretendia fazer um sumário do que de mais
relevante havia sido lançado
em discos de piano ao longo do
século 20.
Em seguida, veio o contrato
com a multinacional Decca/Universal, pela qual, a partir de
2002, o pianista começou a gravar álbuns solo dedicados ao repertório romântico, de Chopin,
Schumann e Brahms.
"Foi bom agora gravar Beethoven para mostrar um outro
lado meu, já que meus discos
estavam muito centrados em
uma certa época, e eu não queria ficar estereotipado", reflete.
O sucesso dos novos álbuns
acaba por estimular o relançamento das antigas gravações do
artista. A Warner está colocando no mercado europeu um
disco triplo, que contém registros de Villa-Lobos e Chopin
que ele fez nos anos 70, para o
selo Teldec.
Com relação aos próximos
álbuns, sua única certeza é a de
que eles existirão, mas o repertório ainda resta por escolher.
Em 2007, Freire cumpre uma
atarefada agenda de apresentações nos principais centros
musicais do planeta, incluindo
uma aparição no Festival de
Salzburgo, em agosto.
Ele é ainda um dos pianistas
da turnê européia que a Osesp
realiza a partir de março do ano
que vem (o outro é o húngaro
Deszö Ránki).
A peça que ele executa na excursão é o mesmo "Concerto nš
4", de Rachmaninov, que tocou
com a orquestra na Sala São
Paulo neste ano. O maestro
John Neschling, diretor artístico da orquestra, já anunciou
que o pianista integrará a turnê
que a Osesp pretende fazer no
Japão, em 2008.
Contudo, no ano que vem, o
artista não faz parte da lista de
solistas que tocam com a orquestra por aqui. Por sinal, ele
ainda não tem nenhuma apresentação confirmada no Brasil
para 2007, mas não se preocupa: "As coisas por aí são mesmo
agendadas em cima da hora".
Texto Anterior: Encontro reúne coletivos de arte para seminário e intervenções Próximo Texto: Frase Índice
|