São Paulo, segunda, 2 de novembro de 1998

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"Carmen é ligeiramente insana"

da Reportagem Local

A meio-soprano norte-americana Carolyn Sebron, 44, acredita que a cigana Carmen é "ligeiramente louca", por aceitar o destino, lido nas cartas, de que morreria assassinada. Ela caminha em direção à morte, mas sem deixar, em momento algum, de exercitar sua liberdade amorosa. Leia a seguir sua entrevista: (JBN)

Folha - Qual a sua familiaridade com o personagem de Carmen?
Carolyn Sebron -
Participei de duas produções, a primeira em Palermo, em 1996, e no ano seguinte em Verona, com a direção de Franco Zeffirelli.
Folha - Zeffirelli acredita que Carmen é contextualmente uma pecadora. Contra ela, pode-se atirar todas as pedras.
Sebron -
Ele me permitiu interpretar o papel de acordo com o que eu pensava. Pessoalmente, acho que Carmen é ligeiramente louca. Ela possui os homens que quer. Não é uma prostituta, é uma operária, uma cigana que acredita na predestinação.
Folha - Há a liberdade amorosa. Ela sabe que homem trará para a sua cama na noite seguinte.
Sebron -
Isso não é próprio de Carmen. Qualquer mulher sabe que cabe a ela escolher o homem com que dividirá a cama. A exteriorização desse comportamento chocou o público há um século.
Folha - Mas ela não é a liberdade no sentido "feminista". Ela é punida com a morte por ser livre.
Sebron -
Outras personagens morrem ao fim de óperas. Violetta ("La Traviata") é comparativamente bem-comportada. Carmen não foi criada por Bizet só para que sua liberdade fosse punida. A morte é só um elemento da tragédia.
Folha - Como assim?
Sebron -
Ela sabia, como cigana, que não poderia escapar da fatalidade que certa vez leu nas cartas. Ela sabia que seria morta.
Folha - É por isso que ela é "ligeiramente louca"?
Sebron -
A insanidade está na aceitação do destino. Ela poderia ter escapado de Don José. Mas ela o espera, sabendo que morrerá.



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