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Marginal de luxo
Coleção de DVDs do cinema marginal chega em março às lojas; no total, serão 38 longas e curtas, de 12 diretores, como Andrea Tonacci, Rogério Sganzerla, André Luiz Oliveira e Elyseu Visconti
FERNANDA EZABELLA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"Sempre tive a impressão de
que o diabo ia com a nossa cara". A frase, dita no longa "Sem
Essa, Aranha", pode resumir o
espírito de guerrilha de uma geração de cineastas que produziu nos anos 60 e 70, avacalhando convenções, censuras e até
mesmo o bom gosto.
Trinta e oito filmes, entre
curtas e longas, de 12 diretores
desse período experimental estão na coleção de DVDs Cinema Marginal Brasileiro, um
projeto de quase 10 anos que
chegará às lojas em março.
O lançamento vem da parceria da Lume Filmes com a Heco
Produções, que realizou em
2001 a Mostra Cinema Marginal, com alguns dos filmes raríssimos que agora fazem parte
da coleção, graças ao apoio da
Cinemateca Brasileira.
A primeira leva trará quatro
DVDs recheados de extras e livretos de 16 páginas, um para
cada diretor: Andrea Tonacci,
Rogério Sganzerla (1946-2004), André Luiz Oliveira e
Elyseu Visconti.
Depois, a cada dois meses, será a vez de mais dois cineastas
(veja quadro ao lado).
"Sem Essa, Aranha" (1970),
espécie de musical escrachado
filmado no Rio, é o filme principal no DVD de Sganzerla e que
nunca fora lançado comercialmente. O diretor deu corpo ao
movimento que ficou conhecido como cinema marginal ao
estrear "O Bandido da Luz Vermelha" (1968), seu filme mais
famoso, lançado em DVD ano
passado pela Versátil.
O protagonista de "Sem Essa,
Aranha" é Jorge Loredo, no papel de Zé Bonitinho, que chega
a fazer striptease vestido, com
mímicas, rodeado de mulheres
nuas num bar decadente.
O DVD traz um depoimento
inédito de duas horas dado no
MIS-SP, em 1990. "O processo
criativo é algo que só um ideograma chinês poderia definir
perfeitamente [...] daria todos
os filmes que fiz [...] para saber
também porque me interessei
por cinema desde a primeira
infância", diz o diretor.
Tonacci
O DVD de Tonacci traz o longa "Bang Bang" (1971), conhecido pelo personagem que usa
máscara de macaco e toma leite
de magnésia. Ao contrário da
anarquia dos números musicais de "Sem Essa, Aranha", Tonacci filma em "Bang Bang"
uma longa série de dança, sem
tirar a atriz do centro da tela.
"É o filme mais rigoroso [da
época] sob o ponto de vista formal [...] do enquadramento, da
câmera, da imagem com o
som", diz Ismail Xavier, numa
palestra durante a mostra de
2001, que vem como extra.
Há também um breve depoimento de Tonacci, explicando
que fazer cinema é "100 por
cento racionalidade, 100 por
cento improvisação". "Cheguei
a chorar de desespero [ao ver
uma página em branco] pela
impotência de conseguir enxergar, visualizar [a cena]", diz.
Documentário para 2010
O DVD de André Luiz Oliveira trará o longa "Meteorango
Kid, o Herói Intergaláctico"
(1969). Rodado em Salvador, o
filme segue um jovem que não
faz nada da vida, tira melecas
do nariz e apronta pela cidade.
O DVD de Elyseu Visconti terá "Os Monstros de Babaloo"
(1970), com detasque para a dupla Zezé Macedo e Wilza Carla.
Eugênio Puppo, dono da Heco, que vem resgatando a história do cinema brasileiro através
de inúmeras mostras e livros,
lidera as pesquisas sobre cinema marginal desde 1999. Ele
promete lançar um 13º DVD,
em 2010, com um documentário do movimento.
"Tenho mais de 100 horas
gravadas das 22 mesas-redondas da mostra", diz Puppo, que
fez o evento em SP, Rio e Brasília. "Sempre tinha uma câmera
na mão, entrevistamos todo
mundo que aparecia, como
Ivan Cardoso, Maurice Capovilla, Jean-Claude Bernardet."
Finalmente, o cinema marginal deixa de ficar à margem.
"Ninguém quer ser marginal,
nem o próprio marginal na vida
real", diz Sganzerla, no DVD.
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