São Paulo, domingo, 03 de janeiro de 2010

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Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

Eduardo Knapp/Folha Imagem
MUDANÇA DE HÁBITO
Com os cães Mike (no colo) e Rex, Sérgio Reis mostra os remédios que toma e os alimentos saudáveis na geladeira

Coração artista

Personalidades que tiveram problemas cardíacos contam como passaram pelo susto e superaram a dificuldade, mesmo tendo que abrir mão de alguns prazeres

Mais descompassado que alemão na escola de samba da Mangueira. É assim que o cantor Sérgio Reis, 69, descreve como palpitava seu coração na manhã de 4 de agosto de 2009. "Fui acordado, como sempre, pelo Mike, meu cachorrinho maltês, e, quando sentei na cama, senti um mal-estar irritante do gogó para baixo", diz à editora-assistente Flávia Mantovani, do Equilíbrio.

 


Não que ele não estivesse acostumado a esse tipo de problema: Sérgio tem fibrilação atrial, o tipo mais comum de arritmia (alteração dos batimentos cardíacos), diagnosticada na década de 80 e que lhe causava uma crise por ano. Nesse dia, porém, a dor foi mais forte do que o normal, e ele foi parar no hospital Albert Einstein.

 

Lá, os médicos descobriram que o cantor estava com quase 80% da artéria entupida, ou "pelo bico do corvo", como define. Após dois dias de tentativas de reverter o problema, foi implantado um stent, pequena "rede" que serve para desbloquear artérias. "O [poeta e cantor] Luiz Vieira tem oito stents. O [produtor musical] Guto Graça Mello tem dez! Eu tô é muito bem", brinca Sérgio.

 

O procedimento foi "uma bobagenzinha". "Eu e o médico ficamos contando piada um para o outro na hora da cirurgia." Ruim mesmo, diz, foi a recuperação. "A gente fica com a perna amarrada, sem poder dobrar, por dois ou três dias, e depois fica tudo roxo. Aquilo é duro."

 

Menos de 15 dias depois, ele já estava fazendo shows novamente -mas sem pular, pois o stent ainda estava se acomodando na artéria. O cantor, que também é diabético, teve que mudar de hábitos. A dieta, antes composta por "porcariadas" como sanduíches, pão e macarrão, agora tem muita comida japonesa, saladas e "tudo grelhado". "Não como, me alimento."

 

Sérgio precisa fazer caminhadas, mas, enquanto não arruma tempo, os shows ajudam. "Danço muito. É "Panela Velha" para cima e para baixo, "Pinga ni Mim" e tudo mais."

 

Os shows são apontados pelo músico Branco Mello, 47, como a melhor atividade física. Além disso, ele faz natação e caminhada, parou de fumar e se alimenta bem. O cantor dos Titãs tinha apenas 36 anos e nenhum sintoma quando descobriu, em um exame de rotina, que estava com um aneurisma (dilatação anormal) na aorta.

 

Seu amigo e médico da família, o gastroenterologista do Sírio-Libanês Raul Cutait indicou o cardiologista Roberto Kalil Filho, que atende o presidente Lula, e logo depois da primeira consulta ele já foi encaminhado para a operação -com o cirurgião Fábio Jatene, filho do ex-ministro da Saúde Adib Jatene. "Disseram que era perigoso e fui internado na hora. Foi tudo muito rápido", lembra.

 

Branco tinha acabado de gravar um disco e resolveu fazer um check-up. "Não sentia nada gritante, mas era fumante e decidi ver se tinha algum problema no pulmão. Depois, me lembrei de que estava com um pouco mais de cansaço."

 

Na operação, sua válvula aórtica foi trocada. Apesar do susto, a cirurgia correu bem e a recuperação foi "supertranquila". "Foi tudo perfeito. Um mês depois, já estava fazendo shows."

 

Tranquila também foi a recuperação do cirurgião plástico Ivo Pitanguy, 84, após uma cirurgia cardíaca. Ele estava em sua ilha particular em Angra dos Reis, a ilha dos Porcos, quando começou a passar mal, em outubro de 2008. Um check-up havia encontrado uma inflamação no pulmão e ele foi aconselhado a não viajar. "Mas estava me sentindo bem e decidi ir com minha mulher."

 

Rita de Azevedo Paiva, médica de sua clínica, acompanhou-os. "Foi a minha sorte. Senti um espasmo, uma dificuldade de respirar, como se fosse asma, mas não sou asmático. A situação foi dramática, mas a doutora Rita tinha levado um nebulizador e atenuou um pouco."

 

O cirurgião foi levado, de barco, para Angra. De lá, foi de helicóptero para o Rio, onde foi internado no Hospital Samaritano. "Os marinheiros que me carregaram e os bombeiros que me ajudaram foram fantásticos." Trocou sua válvula aórtica por uma prótese e colocou pontes de safena e artéria mamária.

 

Ele diz que se sente "melhor do que antes da cirurgia". "Jogo tênis, mergulho, opero. Fiquei mais forte do que antes, até esqueci que fui operado." O cirurgião conta que tem uma vida "bastante espartana". "Esquiei a vida inteira. Fui nadador de criança, tenista e fiz 12 anos de caratê", enumera. Ele também diz que não fuma -"só um charutinho, mas sem tragar".
De benéfico, o exercício passou a ser um problema para o jogador de futebol William Fernando da Silva, 22. Cinco anos atrás, ele tinha acabado de subir do time de juniores para o profissional do Palmeiras e era considerado uma promessa quando ouviu de seus médicos a sentença: não poderia mais se dedicar ao esporte.

 

O culpado era um bloqueio de ramo esquerdo (distúrbio da condução elétrica do coração) seguido de arritmia, que trazia o risco de uma parada cardiorrespiratória caso fizesse o esforço que o futebol exige.

 

Ele descobriu o problema na bateria de exames que os atletas costumam fazer em início de temporada. O então menino de 17 anos foi aconselhado a encontrar outra profissão. "Me disseram para fazer um curso, uma faculdade, porque era praticamente impossível eu retornar ao futebol", lembra.

 

William ficou deprimido e emagreceu oito quilos. "Vi que não conseguiria ficar sem fazer aquilo de que eu gostava." Passou a jogar futebol de salão no seu bairro, o Parque do Carmo, descumprindo a recomendação dos médicos.

 

O Palmeiras ofereceu, então, um trabalho na parte administrativa do clube, para mantê-lo ocupado. Mas William só aguentou dois meses. "Via o pessoal saindo para jogar e eu lá, tirando documento, batendo contrato. Ficava chateado."

 

Dois anos depois de descobrir o problema, ele pôde começar a reabilitação, com o cardiologista Nabil Gorayeb, no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo. Teve uma recuperação surpreendente e, gradativamente, a arritmia foi desaparecendo. Já nessa época, em 2006, William voltou a jogar.



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