São Paulo, Quinta-feira, 03 de Fevereiro de 2000


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CINEMA
Roterdã mistura gêneros

CARLOS ADRIANO
especial para a Folha, em Roterdã


Alguns filmes neste 29º Festival Internacional de Cinema de Roterdã subvertem uma base documental para criar intervenções ficcionais. Os limites entre os gêneros são abolidos em claves paródicas, ensaísticas e históricas.
Em "Piranha Blues: Film 1" (Bélgica), o pai do diretor (e ex-advogado) Willem Wallijn é preso no escândalo político Agusta-Dassault e o filho se torna porta-voz junto à imprensa. Ele tenta analisar a situação deste ponto de vista, mas a realidade foge de suas mãos. O filme está longe de ser uma reportagem sobre o caso dos votos roubados, pois os personagens de ficção se intrometem na história supostamente documental. Assim, a investigação assume outros rumos e alvos.
"L + R", de Edgar Honetschläger (Áustria) é um ensaio audiovisual sobre os (des)entendimentos entre japoneses e ocidentais, fazendo um combinado entre ações encenadas, registros espontâneos e materiais de arquivo. Uma jovem japonesa é escalada para ser escada nas digressões, anedotas e enumerações narrativas, mas ela resiste ao olhar "impositivo" do diretor e desvia o foco predeterminado, evitando o documentário linear. As letras do título aludem à troca comum na pronúncia japonesa. A japonesa resume a querela quando reclama que os europeus estão sempre precisando de explicações.
"La Genèse", de Cheick Oumar Sissoko (Mali), parte da premissa de alguns biólogos evolucionistas que sugerem uma proposição (metafórica) da existência de Adão e Eva negros e continua: por que não o seria também o patriarca Jacó? Esse é o primeiro filme feito na África baseado e transplantado no Antigo Testamento ("Gênesis", 23-27) e afigura-se como um épico que cruza religiões monoteístas e sistemas tribais, numa peça em dupla vertente: mítica e antropológica.
Em "Enzo, Domai a Palermo!", os implacáveis e corrosivos Daniele Ciprì e Franco Maresco seguem (e perseguem, com ironia demolidora) a figura de Enzo Castagna, carismático mafioso e agente cinematográfico, numa pseudoreportagem que documenta e desconstrói a tênue fronteira entre realidade e ficção. A irreverência resulta ainda do contexto siciliano, pródigo na mixórdia entre a subindústria do entretenimento, a máfia e cinema.


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