São Paulo, Quinta-feira, 03 de Fevereiro de 2000


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TEATRO
Obra de Rodrigo Pitta e Daniel Ribeiro, que estréia hoje em SP, quer romper convenção do gênero no país
Musical defende inovação via Cazuza

Rodney Suguita/Folha Imagem
O ator Lulo Scroback, ao centro, e parte do elenco de "Cazas de Cazuza", que estréia na Tom Brasil


VALMIR SANTOS
free-lance para a Folha

Cazuza era um ator canastrão. Pichava a si próprio quando se tratava de subir ao palco, como fez na adolescência, em montagens amadoras, ou de encarar uma câmara, como ousou na participação especial com o Barão Vermelho em "Bete Balanço" (94), o filme. "Sou ruim à beça, tenho que partir para outra", escrachava o cantor e compositor carioca morto em 90, aos 32 anos.
Quem conta essa história à Folha é sua mãe, Lucinha Araújo, logo depois de assistir o ensaio da ópera-rock "Cazas de Cazuza", que estréia hoje na casa de shows Tom Brasil, em São Paulo.
"É a homenagem mais bonita que meu filho recebeu", revela Lucinha, 63. "O Cazuza sempre foi muito teatral no palco e o musical veio completar isso", avalia o pai, João Araújo, 64. O casal não imaginava que dois rapazes que mal tinham largado a chupeta quando Cazuza iniciava a carreira, em 81, seriam capazes de causar tanta emoção.
Os louros vão para o diretor geral Rodrigo Pitta e para o diretor musical Daniel Ribeiro. No início, Lucinha confessa que temia a investida. "Tinha medo da imagem que o espetáculo passaria. Não se pode ater, por exemplo, ao fato de ele ter mostrado a bunda para o público em uma ou outra ocasião. Isso era muito pouco para quem foi Cazuza", afirma. Depois da curta temporada em São Paulo, a montagem segue para o Rio, onde estréia em 16 de março, no Canecão, palco no qual o cantor fez seu último show.
Apesar dos currículos incipientes, Pitta e Ribeiro estão protagonizando uma mudança parcimoniosa e consistente no modo de fazer teatro musical no Brasil. Ambos frequentaram cursos de especialização nos EUA. São apaixonados pela Broadway e pelo West End, respectivamente os distritos americano e inglês dos grandes musicais.
Pitta, que não guarda nenhum parentesco com o prefeito Celso Pitta, conquistou visibilidade em São Paulo a partir de 94, com o espetáculo "Pockett Broadway", uma colagem com números de "Hair", "Os Miseráveis", "O Fantasma da Ópera" e outros. Em 97, chegou a divulgar com estardalhaço o projeto de levar "O Cortiço" para o palco, com músicas de Caetano e Gil, mas a adaptação do livro de Aluísio Azevedo não vingou, por falta de patrocínio.
Naquele mesmo ano, seu amigo Ribeiro prestou audição e ficou entre os finalistas para a montagem paralela de "Rent", na mesma Broadway, porém destinada a turnês internacionais. O projeto também não foi adiante, por problemas financeiros, e Ribeiro acabou conquistando o papel do protagonista Mark na versão brasileira do espetáculo de Jonathan Larson, atualmente em cartaz no teatro Ópera, em São Paulo.
Equilibrando-se entre a utopia profissional e a instabilidade das produções artísticas no país, Pitta e Ribeiro criaram em 98 a Companhia Brasileira de Teatro Musical, hoje dona de um "cast" de cerca de 150 nomes, entre atores, dançarinos, cantores e músicos. Dos 16 intérpretes de "Rent", pinçados entre 2 mil candidatos, 11 são provenientes da CBTM.
"Cazas de Cazuza" começou a ganhar corpo no final de 98. Desde o "parto" do texto de Pitta, então um leigo na obra do cantor e compositor, passando pela concepção musical, por Ribeiro, mais a escolha dos 16 atores-cantores e obtenção de recursos, tudo transcorreu como devia. Até a desvalorização do real em relação ao dólar, em agosto de 98. Resultado: o patrocínio foi suspenso e o elenco, dispensado. "Foi aquela choradeira", lembra Pitta.
Contudo, o entusiasmo retornaria duas semanas depois, quando o diretor foi apresentado ao empresário Paulo Amorim, um dos sócios fundadores da Tom Brasil. Após assistir à leitura dramatizada do texto, Amorim pediu a "reconvocação" do elenco para os ensaios e garantiu o investimento, até agora, de R$ 440 mil.
O orçamento inclui CD com 20 faixas do musical. A produção é de Jane Duboc e deve chegar às lojas na próxima semana, pela Som Livre. "O Brasil está precisando inovar a sua linha de showbiz", acredita Amorim, 45.
Todo esse processo de ascensão e queda, tal qual o "paraíso duvidoso" do poeta, culminou com a corrente para a frente dos últimos oito meses de trabalho. E chegou mesmo a hora de "Cazas de Cazuza" mostrar a cara, pois já sabemos o nome do teu sócio.


Peça: Cazas de Cazuza Autor e diretor geral: Rodrigo Pitta Direção musical: André Ribeiro Com: Marcelo Góes, Daniela Cury, Wagner Emmy, Nayma Ferreira, Tatiana Parra, Mariana Elisabetsky e outros. Quando: estréia hoje, 21h30; qui., 21h30; sex. e sáb., 22h; dom., 20h. Onde: Tom Brasil (r. Olimpíadas, 66, Vila Olímpia, tel. 0/xx/11/820-2326) Quanto: R$ 20 a R$ 45

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