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Estréia hoje "O Segredo de Brokeback Mountain", que não pode ser resumido a um "faroeste gay"
O melodrama de Ang Lee
CÁSSIO STARLING CARLOS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"O Segredo de Brokeback
Mountain" chega hoje aos
cinemas brasileiros carregado de
láureas e de equívocos. O filme do
diretor de origem chinesa Ang
Lee, baseado num conto da escritora Annie Proulx publicado em
1997 pela revista "The New Yorker", narra o romance entre dois
caubóis isolados numa montanha
do Wyoming. Com o Leão de Ouro no Festival de Veneza, quatro
Globos de Ouro na bagagem e oito Oscars na mira, a história tem
sido vendida como o "primeiro
faroeste gay" do cinema.
O argumento vem carregado de
ignorância. O subtexto homossexual já alimentava nove de cada
dez westerns clássicos (o elogio
feito por Montgomery Clift e John
Ireland às mútuas pistolas em
"Rio Vermelho" é só o mais óbvio), sem esquecer o pioneirismo
de Andy Warhol no explícito "Lonesome Cowboys" (1968). Para
que diabos serviria cultuar um filme que tira seus heróis do armário para isolá-los no alto de uma
montanha ou defender a quebra
de tabu do filme argumentando
que os protagonistas são "heterossexuais confirmados"?
O que de fato Ang Lee fez foi retomar a tradição cujo ápice encontra-se em Douglas Sirk mas
que também passa por Vincent
Minnelli, John Stahl e outros de
glória menor, todos dedicados a
explorar o melodrama como gênero maior, que abriga as forças
irracionais da paixão e do desejo e
a impossibilidade de sua conjugação perfeita com as regras sociais.
Como Todd Haynes já havia
proposto em 2002 em "Longe do
Paraíso", "O Segredo de Brokeback Mountain" também relê
"Tudo que o Céu Permite", de
Sirk, e não deixa de comprovar
sua atualidade.
Lá já estavam o princípio básico
de um amor impossível, o complô
social contra sua realização e a natureza como espaço não apenas
idílico, mas sobretudo livre das
convenções, num rousseauísmo à
americana.
O que um diretor de personalidade débil como Ang Lee poderia
oferecer à renovação de um gênero regido por excessos? Ciente de
seus limites, Lee toma o rumo
oposto e guarda do melodrama a
ossatura. De resto, seu filme é todo feito de retenção, de não-ditos,
de cores esmaecidas e de uso contido da música, expressões cinematográficas ajustadas à paixão
de Ennis por Jack, tanto mais forte quanto mais sufocada.
É essa maneira de filmar em um
tom menor que permite a Lee
uma captura dos sentimentos. O
diretor faz da câmera um uso sismográfico, registrando os abalos
na profundidade de seus protagonistas, cujo caso exemplar encontra-se na cena em que Ennis
aguarda a chegada de Jack em seu
primeiro reencontro.
De resto, só o fato de oferecer,
no auge da cultura do consumo e
do individualismo extremos, uma
história de amor baseada na renúncia pode não parecer, mas vista com os dois olhos abertos é algo
bastante revolucionário.
O Segredo de Brokeback Mountain
Brokeback Mountain
Produção: EUA, 2005
Direção: Ang Lee
Com: Heath Ledger, Jake Gyllenhaal
Quando: a partir de hoje nos cines Frei Caneca, Anália Franco e circuito
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