São Paulo, domingo, 03 de fevereiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Uma câmera na mão e um monstro na cabeça

"Cloverfield -Monstro", que estréia nesta sexta, usa visual de vídeo do YouTube para mostrar ataque a NY; diretor fala à Folha sobre como fez o filme parecer "amador'

Divulgação
A Estátua da Liberdade, que é decapitada pela criatura de 'Cloverfield - Monstro'


MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL

É o filme de monstro da geração YouTube. É uma catarse diretamente ligada aos sentimentos do 11 de Setembro. É "Godzilla" filmado ao estilo de "A Bruxa de Blair".
É "Cloverfield - Monstro", o blockbuster produzido por J.J. Abrams (de "Lost") que chega aos cinemas nacionais na próxima sexta, depois de estabelecer o recorde de bilheteria de janeiro nos EUA (US$ 41 milhões no primeiro fim de semana, para um custo de US$ 30 milhões, fora o marketing).
É também o mais bem-sucedido caso de propaganda viral já visto na web, uma campanha cheia de mistérios e desdobramentos que deixou os blogs em polvorosa desde que os primeiros sinais do filme surgiram, na forma de um trailer pouco elucidativo, divulgado na estréia do filme "Transformers", em julho.
"A idéia era fazer material complementar que parecesse real, como se fosse criado por outras pessoas, porque no filme a informação é limitada pelo ponto de vista restrito", diz Matt Reeves, diretor do filme, à Folha, por telefone.
"Nossa história pretendia recriar as sensações das pessoas ao passar por um evento desses, do ponto de vista restrito que elas têm, sem informação. Os outros pedaços do quebra-cabeça foram espalhados como uma rede de informações, formando uma metahistória."

Ponto de vista "real"
Como em "A Bruxa de Blair" (1999), o que se vê é uma história contada em retrospecto, a partir do material de uma câmera de vídeo resgatada pelos militares após o desastre.
Na gravação que está na câmera, o espectador é apresentado a Rob Hawkins, um jovem que está de partida para um emprego no Japão e que ganha uma festa de despedida secreta.
As imagens da festa vão sendo registradas por Hud, um amigo de Rob, e é do ponto de vista dele que o espectador acompanha os incidentes que se sucedem a partir de uma série de explosões à distância.
Os jovens saem à rua sem muita noção do que está acontecendo, até que a cabeça da Estátua da Liberdade chega voando, arrancada por algo não identificado, mas que faz grunhidos apavorantes.
Daí em diante, estabelecem-se o caos e a correria, e o público vai a reboque da câmera amadora conduzida por Hud (em várias ocasiões literalmente, já que o ator T.J. Miller empunhou o equipamento).
"Assisti a muitos vídeos do YouTube para ver como as pessoas gravam suas vidas. Tanto do que acontece hoje é colocado na internet porque é o modo como a nova geração processa o mundo, e o estilo do filme é baseado nisso", diz Reeves.
Mas fazer um filme profissional parecer algo amador não é tão simples quanto parece.
"O desafio foi que eu queria que a filmagem parecesse acidental, mas que tivesse uma narrativa cinematográfica, e precisava juntar isso de modo sutil. A maioria das cenas teve mais de 40 tomadas, porque era uma busca pela tomada certa, que parecesse acidental."
O resultado ficou tão realista e frenético que alguns espectadores sentiram-se mal, nos EUA, com tonturas e enjôos.

"Está vivo!"
Para somar ao realismo desejado, um elenco de desconhecidos era "crucial", diz o diretor.
"A idéia era fazer um filme que parecesse uma filmagem caseira que o próprio público pudesse ter feito, então colocar Will Smith quebraria a ilusão."
Diferentemente de "A Bruxa de Blair", que não mostra seu personagem-título, "Cloverfield" nunca considerou ficar apenas no suspense.
"A graça desse filme é que, depois de usar um estilo realista e gerar toda a expectativa, que é uma referência aos climas de "Alien" e "Tubarão", nós mostramos o monstro."
De fato, o bicho aparece -e é difícil dizer qualquer coisa sobre ele, além de que é bem alto (tem mais de 105 metros, segundo o diretor, ultrapassando a altura dos prédios, na tela) e de que não, não se parece em nada com o Godzilla.
"É um bebê, recém-nascido. Ele está confuso, desorientado e irritável. E estava submerso nas águas há milhares e milhares de anos", diz o produtor Abrams nas notas da produção.

Pesadelo coletivo
Ver Nova York sob ataque, com prédios caindo, poeira subindo e gente correndo, remete imediatamente ao 11/9/2001.
"Assim como o "Godzilla" original era uma metáfora para a ansiedade daquela era nuclear, e isso era parte de sua atração, queríamos criar nosso monstro americano remetendo ao pesadelo coletivo que tivemos, e suas raízes estão definitivamente no 11/9", diz Reeves.
A crítica estrangeira não foi unânime em sua análise do filme -e pelo menos parte do público parece ter concordado com os detratores do longa, porque ele sofreu um espetacular tombo de 68% nas bilheterias em seu segundo fim de semana nos EUA.


Texto Anterior: Horário nobre na TV aberta
Próximo Texto: Mônica Bergamo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.