São Paulo, sábado, 03 de maio de 2008

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Crítica/"Cuba sem Fidel"

Esboço biográfico joga luz sobre história de Raúl Castro

Escrito por ex-agente da CIA, obra destaca Fidel, mas ajuda a entender novo líder

OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Raúl Castro, o novo líder de Cuba, ainda é um desconhecido. Embora observadores mais atentos estejam cientes de que se trata de um político pragmático, com talento para a administração, a biografia do irmão do líder Fidel Castro é, em grande parte, ignorada.
Poucos sabem que se trata de um homem que contemporiza diante de decisões desagradáveis, depende psicologicamente da aprovação de terceiros e é avesso a leituras. Ou que, inseguro desde a juventude (chegou a treinar como toureiro para melhorar a autoconfiança), tornou-se alcoólatra (ainda não recuperado).
Esse perfil de Raúl, que completa 77 anos em um mês, foi traçado por Brian Latell em "Cuba sem Fidel". Ex-agente da CIA, Latell tem autoridade. Foi o responsável por corrigir um erro de avaliação do governo americano, que o subestimava.
Apesar do que o título sugere, o livro não é principalmente sobre Raúl. Fidel merece bem mais espaço. Mas o revolucionário histórico é conhecido de todos, e Latell, que cita extensivamente a entrevista que Fidel concedeu a Frei Betto em 1985, não apresenta novidade. Assim, a obra vale pelo esboço biográfico de quem, a partir de agora, dá as cartas na ilha.
Raúl é retratado em dois momentos. Nos primeiros tempos da revolução, quando ostentava um longo rabo-de-cavalo que lhe valeu o apelido de El Chino, militava na linha-dura.
Era também chamado de "Robespierre de Cuba", referência ao terror jacobino que espalhou com muitas execuções no país. Nessa época, empurrado por Fidel, aproximou-se de Moscou. Apreciava a cultura soviética a ponto de manter em seu gabinete suvenires do país que sustentaria Cuba.
Mas esse é o Raúl do passado. Mais útil é conhecer o Raúl de hoje. Sua base são as Forças Armadas, a instituição cubana mais bem preparada, em parte pela meritocracia que Raúl, enquanto ministro da Defesa, fez prevalecer nas promoções.

Futuro
O que esperar de seu governo? Na economia, uma abertura já em curso, tendo como modelo a China. Na política, a manutenção da ditadura comunista (Latell vislumbra a possibilidade da eleição de um presidente civil, mas esse fato isolado pouco significaria). Na diplomacia, Raúl deve tentar aproximação com os Estados Unidos. Evidência disso, argumenta o autor, é o fato de, enquanto ministro, ter aprovado o uso da base de Guantánamo pelos EUA para receber suspeitos de terrorismo.
Para Latell, o futuro de Raúl dependerá de como ele lidar com a sociedade civil. "Ele terá de adotar medidas palpáveis a fim de aplacar o descontentamento geral e elevar o padrão de vida das massas, sem, no entanto, abrir as válvulas de forma muito exagerada ou muito precipitada."
Apesar do posfácio escrito em fins de 2007, "Cuba sem Fidel" tem, aqui e ali, informações defasadas, um defeito menor diante da lacuna que preenche.


OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de "A História do Brasil no Século 20" (em cinco volumes, pela Publifolha).


CUBA SEM FIDEL
Autor: Brian Latell
Tradução: Jorge F. Soares
Editora: Novo Conceito
Quanto: R$ 39,90 (346 págs.)
Avaliação: bom



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