São Paulo, sábado, 03 de setembro de 2011 |
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O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo. CRÍTICA LITERATURA Obra de Fielding é testemunho do pré-moderno "A História das Aventuras de Joseph Andrews..." revela literatura do período anterior às revoluções burguesas FLÁVIO MOURA ESPECIAL PARA A FOLHA Na ruidosa mesa em que entrevistou Claude Lanzmann na última Flip, o crítico Márcio Seligmann-Silva fez uma observação reveladora: ele lembrou como é preciso inventar formas de expressão para dar conta de experiências novas. As nove horas que dura o filme "Shoah", dirigido por Lanzmann, são uma reinvenção do formato documentário para dar conta da brutalidade do Holocausto. Da mesma maneira, o romance é a forma encontrada pelo século 19 para dar conta do avanço da era moderna. As observações vêm a calhar a propósito de "A História das Aventuras de Joseph Andrews e seu Amigo o Senhor Abraham Adams", de Henry Fielding (1707-1754). O livro, que acaba de ganhar edição caprichada em português, foi lançado originalmente em 1742. É notável como, em meados do século 18, o romance tal como o conhecemos não dava indício do ímpeto com que ia aflorar. Esse livro desperta interesse hoje sobretudo por isto: é o testemunho de uma época de transição, dos tateios próprios da passagem das formas clássicas para a tradição moderna. Mais conhecido como autor de "Tom Jones", Fielding figura entre os fundadores da moderna literatura inglesa ao lado de Daniel Defoe (1660-1731), autor de "Robinson Crusoé", e de Laurence Sterne (1713-1768), de "A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy". O livro é uma sátira política e de costumes à maneira de Dom Quixote, mas ambientado na Inglaterra um século depois e cujo protagonista é um padre de província: pastor Abraham Adams. Quem tiver lido o Quixote vai reconhecer o formato: capítulos curtos antecedidos de resumos, digressões sobre a forma de narrar, diálogos repentinos com o leitor, referências a personagens literários populares na época. Adams é um tipo histriônico que cai na estrada ao lado do jovem Andrews, empregado despedido injustamente por sua senhora. A dupla viaja pelo país, enfiando-se em brigas e lances típicos da melhor tradição picaresca, que remonta ao século 16. Ao redor deles, desfilam tipos sociais da Inglaterra do período, em caricaturas de forte apelo cômico e visual. O curioso é notar como o livro está mais próximo do Quixote e seus antecessores do que de romancistas modernos ingleses como Jane Austen (1775-1817). Escrito antes das revoluções burguesas, é como se fosse muito mais velho do que é. Em pouco, a modernidade chegaria de atropelo e precipitaria formas novas de narrar, dando origem ao romance como o conhecemos. A introdução é informativa e a tradução resulta de uma pesquisa diligente, apesar de deslizes de revisão. Há ainda uma quantidade imensa de notas para clarear as referências desconhecidas. São cuidados reveladores da natureza do livro: desprovido desses instrumentos de navegação, é pouco provável que o leitor chegue ao fim da jornada. FLÁVIO MOURA é jornalista e mestre em sociologia pela USP. A HISTÓRIA DAS AVENTURAS DE JOSEPH ANDREWS E SEU AMIGO O SENHOR ABRAHAM ADAMS AUTOR Henry Fielding EDITORA Ateliê Editorial TRADUÇÃO Roger Maioli dos Santos QUANTO R$ 85 (384 págs.) AVALIAÇÃO bom Texto Anterior: Painel das Letras - Josélia Aguiar: Grandes e pequenas Próximo Texto: Artes plásticas: Gui Mohallem ganha exposição individual no MuBE Índice | Comunicar Erros |
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