São Paulo, sábado, 03 de outubro de 2009

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O papel contra-ataca

Editoras e gráficas brasileiras apostam na edição e impressão de livros sob encomenda; nova tecnologia permitiu melhorar o acabamento e diminuir custos, o que pode tirar do limbo milhares de títulos atualmente esgotados

MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto todos aguardam a "revolução do digital", que pode esvaziar as prateleiras e mudar o conceito de leitura, uma outra transformação está em curso no mundo editorial, e no sentido inverso. É a aposta na impressão sob encomenda ("on demand"), que está mobilizando editoras e gráficas e pode tirar do limbo milhares de títulos fora de catálogo.
O grupo Ediouro, um dos maiores do país, é um dos principais apostadores. Lançou a editora Sinergia para resgatar títulos esgotados do próprio grupo e de outras editoras também. Em dois meses de atividade, incluiu 110 títulos e vendeu 1.000 exemplares.
"Para todos os livros tem um comprador", diz Alberto Schprejer, editor da Sinergia. "Isso tem a ver com a teoria da "cauda longa" [do livro homônimo de Chris Anderson]. Segundo essa estratégia de negócios, a meta é vender poucas unidades de muitos e variados itens.
Antiga parceira da Ediouro, a gráfica paulista Bandeirantes, uma das pioneiras na área, também está apostando de forma pesada no segmento.
"Foram quase 15 anos para fazer a maturação", diz Enrique Reyna, gerente de contas da empresa, que atende editoras como Ática, Scipione, Global, Annablume, Elsevier e Pearson. Ele diz que a chave para a transformação foi a evolução da qualidade gráfica -atualmente igual à da impressão tradicional- e a queda dos custos. "Nos Estados Unidos e na Europa a tendência é que as tiragens caiam. Algumas editoras e gráficas já têm o foco apenas na impressão digital."
A Bandeirantes lança na segunda um serviço batizado de BandBook, em que o usuário poderá comprar os títulos diretamente do portal da empresa. O títulos ainda se limitam àqueles já negociados com as editoras conveniadas, mas a gráfica pretende fechar acordo com um grande número de editoras. Pretende absorver a gestão do livro desde a comercialização e impressão até a entrega ao leitor.
Uma das editoras que mais promete se beneficiar da tecnologia é a universitária Unesp. Ela foi uma das pioneiras. Em 1995 chegou a ter impressora própria, mas desistiu oito anos depois. Voltou ao sistema há três anos.
"Pelos avanços técnicos o cenário mudou", diz Jézio Hernane Bomfim Gutierre, diretor-executivo da editora. "Estamos notando há algum tempo. Com catálogo grande, com mais de 1.000 títulos, você tem uma faixa de 20% a 30% de livros que ficam esgotados. Não temos recursos para reimprimir. Esse sistema é uma maneira de viabilizar e manter todo o catálogo vivo." Segundo ele, em menos de um ano "todo o catálogo de 1.200 títulos será vivo".
Outra editora pioneira no setor foi a gaúcha L&PM, que introduziu a impressão sob demanda em 1996 e a manteve por três anos. "Nós trabalhamos muito nisso, introduzimos ganhos tecnológicos", diz o editor Ivan Pinheiro Machado.
A L&PM é a editora mais bem-sucedida no segmento de livro de bolso do país. Machado diz que a impressão de baixas tiragens permitiu a diversificação e a experimentação, importantes para o desenvolvimento do segmento. "Se não fosse essa máquina não teríamos feito a nossa coleção de bolso", diz. Mas ele se mostra cético. Segundo ele, a impressão sob encomenda "é uma utopia. Não dá para revogar a lei da economia de escala".
É a mesma opinião de Sérgio Machado, presidente da Record, a maior editora do país, que acaba de anunciar investimentos de R$ 10 milhões. O objetivo é dobrar a capacidade de impressão, para 10 milhões de exemplares por ano.
Para isso, a editora apostou tanto nas altas tiragens como na impressão digital -a mesma que permite edições unitárias. "Para pequenas tiragens o digital é a melhor solução", diz. Mas, em baixas tiragens, a Record pretende investir em títulos com 600 ou 800 exemplares, e não partir para a edição sob encomenda. Para Machado, essa impressão vai beneficiar sobretudo as editoras universitárias e jurídicas e os títulos sob domínio público. "A questão é de modelo de negócio", diz.
Para ele, o que impede o Brasil de avançar na impressão sob demanda é uma questão legal. "Desde a Lei de Direitos Autorais [nº 9.610/98], os autores passaram a migrar para contrato por tempo determinado, o que não ocorre nos EUA. No nosso modelo trabalhamos cinco anos, daí precisamos recomprar o livro."
Se no Brasil a impressão sob encomenda ainda está se esboçando, nos EUA está em franca expansão. Segundo a revista "Publishers Weekely", o número de títulos lançados pelo sistema nos EUA superou em 2008 pela primeira vez a cifra de títulos da impressão tradicional.


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