São Paulo, segunda-feira, 03 de dezembro de 2001

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MEMÓRIA

A rechonchuda por trás da "femme fatale"

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Jean Renoir costumava olhar para Marlene Dietrich (1901-1992) com um lamento. Em vez de ver nela o símbolo sexual, a grande "femme fatale" do cinema, só pensava no esforço que essa camponesa rechonchuda devia fazer para se manter magra.
Essa Marlene rechonchuda, que parece uma lenda criada pelo diretor francês, nunca aparece nos filmes, mas pode ser vista em algumas fotos de juventude na exposição "Marlene Dietrich - Uma Lenda em Imagens".
Antes ainda de ser descoberta por Joseph von Sternberg e se tornar a estrela de "O Anjo Azul" (1930), Marlene já fazia força para mostrar uma silhueta mais esguia. É essa imagem que a consagrou: magra e sensual, com uns olhos enormes, que pareciam capazes de seduzir qualquer homem. Era assim, aliás, no próprio "O Anjo Azul". Continuou sendo assim quando foi a Hollywood para filmar "Marrocos".
Com uma diferença: em "Marrocos" (1930), Sternberg a faz entrar em cena vestida de homem, consagrando a ambiguidade da imagem de Marlene: era como se o toque masculino de suas atitudes, seu ar de permanente desafio, devesse ser desmontado para que então surgisse de forma plena a mulher capaz de atravessar desertos atrás do seu homem.
Talvez na vida real ela não fosse tão diferente. Era exigente, controladora, capaz de se rebelar mesmo contra Sternberg. Quando topava outro tipo dominador -como Fritz Lang- as faíscas saltavam. Basta ver o testemunho pouco amistoso que ela dá em "Marlene", belo documentário feito por Maximilian Schell (sim, o famoso ator alemão) e que será exibido como parte da mostra.


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