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MEMÓRIA
A rechonchuda por trás da "femme fatale"
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Jean Renoir costumava olhar
para Marlene Dietrich (1901-1992) com um lamento. Em vez de
ver nela o símbolo sexual, a grande "femme fatale" do cinema, só
pensava no esforço que essa camponesa rechonchuda devia fazer
para se manter magra.
Essa Marlene rechonchuda, que
parece uma lenda criada pelo diretor francês, nunca aparece nos
filmes, mas pode ser vista em algumas fotos de juventude na exposição "Marlene Dietrich - Uma
Lenda em Imagens".
Antes ainda de ser descoberta
por Joseph von Sternberg e se tornar a estrela de "O Anjo Azul"
(1930), Marlene já fazia força para
mostrar uma silhueta mais esguia. É essa imagem que a consagrou: magra e sensual, com uns
olhos enormes, que pareciam capazes de seduzir qualquer homem. Era assim, aliás, no próprio
"O Anjo Azul". Continuou sendo
assim quando foi a Hollywood
para filmar "Marrocos".
Com uma diferença: em "Marrocos" (1930), Sternberg a faz entrar em cena vestida de homem,
consagrando a ambiguidade da
imagem de Marlene: era como se
o toque masculino de suas atitudes, seu ar de permanente desafio,
devesse ser desmontado para que
então surgisse de forma plena a
mulher capaz de atravessar desertos atrás do seu homem.
Talvez na vida real ela não fosse
tão diferente. Era exigente, controladora, capaz de se rebelar
mesmo contra Sternberg. Quando topava outro tipo dominador
-como Fritz Lang- as faíscas
saltavam. Basta ver o testemunho
pouco amistoso que ela dá em
"Marlene", belo documentário
feito por Maximilian Schell (sim,
o famoso ator alemão) e que será
exibido como parte da mostra.
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