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"171"
Versão americana capta LA artificial
CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Os filmes "171", "A Má Educação" e "Entreatos", em seus
mecanismos, nos dizem mais ou
menos a mesma coisa: a vida é
uma questão de encenação. Mais
próximo de Pedro Almodóvar,
"171" nos faz crer que as pessoas
sobrevivem por meio de papéis e
do disfarce. Em ambos, cada pessoa não é apenas uma única pessoa. É outra, e depois outra.
Um picareta aparatado como
policial vê jovem malandro agindo. Depois de uma falsa prisão,
vem o convite para uma jornada
de golpes e falsificações. Passam a
tarde, em Los Angeles, vivendo
personagens. Um se faz de neto de
uma idosa que nunca viu e também de executivo num restaurante. O outro se finge de irmão do
primeiro, depois de se travestir de
herói num elevador.
O filme é remake do argentino
"Nove Rainhas". Mas há uma artimanha, cultural, nesse reprocessamento. Jacobs capta como cenário central a LA glamourosa e
artificial dos grandes hotéis -casas de plástico, de mentira- e de
Beverly Hills: território do consumo. Monumento urbano à flutuação das imagens e identidades.
"171" é um estudo sobre a vocação. Ou uma observação do mundo a partir do talento, orientado
para o delito, do ilusionismo: um
ofício dos que sabem fingir, interpretar. E surgem outros parentes.
De "Pickpocket" (Bresson) a
"Cartas na Mesa", de 1997.
Há um certo golpe na relação
com o espectador, não apenas no
imprevisível roteiro. O projeto de
filmagem se faz na dissimulação e
na aparência. A começar por L.A.,
maquiada como lugar surpreendido pela câmera: há uma verdade pulsante "de mentira". O truque também está nesse aspecto de
adaptação de um sucesso estrangeiro. Trocam-se as vestes, acessórios são agregados, tudo em nome de uma operação de mercado.
Operação que talvez reflita a alma
"verdadeira" da obra. Pelo menos
em seu final, uma tentativa de
moralização que trapaceia os esforços estéticos do fingir.
171
Criminal
Direção: Gregory Jacobs
Produção: EUA, 2004
Com: John C. Reilly, Diego Luna
Quando: a partir de hoje no Espaço
Unibanco, HSBC Belas Artes e Lumière
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