São Paulo, sexta-feira, 03 de dezembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"NATHALIE X"

Mulher estabelece jogo de sentimentos entre marido e prostituta

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Na primeira seqüência de "Nathalie X", Catherine (Fanny Ardant) leva um fora de Bernard (Gérard Depardieu), seu marido, que estica a viagem que fazia e não comparece à festa surpresa que ela lhe havia preparado.
Um mau acaso, talvez. Mas Catherine descobre que é mais do que isso. O marido, que há tempos não comparece, andou saindo com várias garotas. Ela agora o tem por mentiroso compulsivo. Mas até onde a coisa vai?
Em vez de adotar o clichê e buscar um bom detetive, ela procura uma prostituta, na pessoa de Marlene, doravante Nathalie (Emmanuelle Béart). O objetivo é forjar um encontro de Nathalie com Bernard e, com isso, controlar a vida e os sentimentos do homem.
Trata-se de um jogo perigoso, como veremos ao longo do filme, que implica algumas variáveis interessantes: pode toda essa farsa levar à liberação de Catherine? O silêncio que envolve seu casamento se aprofundará ou se dissipará? Haverá um outro tipo de diálogo, com outra pessoa, que se estabelecerá? Qual o estatuto do casamento francês?
Enfim, há um mistério que se estabelece e tende a se tornar mais denso entre esses personagens, em que freqüentações inusuais se estabelecem. Ora veremos Catherine, médica ginecologista, se tornando freqüentadora de um bordel, ora Nathalie envolvendo-se com a profissão de maquiadora.
Esse quê buñuelesco se aprofunda cada vez que Nathalie narra as aventuras amorosas que entretém com Bernard e o início de um envolvimento que tende a se tornar menos profissional.
É graças a essas aventuras, no entanto, que Catherine se mantém viva (apesar da mágoa) e também, talvez, Nathalie (o título brasileiro assimilou esse "X" final, no que fez muito bem, pois ela é a incógnita do filme): é a capacidade de fabulação que é acionada com vigor pelo encontro entre os três personagens.
O final reserva uma surpresa que ao mesmo tempo encerra a força e a fraqueza do filme. Pois nós, espectadores, partilhamos as histórias e somos levados a crer que são inteiramente verídicas, pois construídas classicamente.
Algo, porém, soa falso em tudo isso e, ao final, saberemos até que ponto o todo-saber que o filme transmite ao espectador é nada mais do que uma armadilha, como tantas que os personagens parecem estar sempre prontos a preparar uns para os outros.
Interessante maneira de romper com a ilusão representativa clássica. Mas, talvez, meio forçada.


Nathalie X
Idem
   
Direção: Anne Fontaine
Produção: França, 2003
Com: Emmanuelle Béart, Fanny Ardant
Quando: a partir de hoje no Frei Caneca Unibanco Arteplex, Lumière, Pátio Higienópolis e Sala UOL



Texto Anterior: "Bridget Jones: No Limite da Razão": Fórmula se desdobra em série moralista
Próximo Texto: "Lado Selvagem": Triângulo gay derruba preconceitos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.