|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Bullock sintetiza dilemas da felicidade
Segundo pesquisas, situação conjugal é mais importante do que outros itens para determinar o bem-estar pessoal
Sexo, encontros sociais e jantares são atividades associadas à felicidade; deslocamento de ida e vinda do trabalho é prejudicial
DAVID BROOKS
DO "NEW YORK TIMES"
Duas coisas aconteceram
com Sandra Bullock em março.
Primeiro, ela ganhou um Oscar
de melhor atriz da Academia.
Depois, a mídia noticiou que
seu marido é um canalha adúltero. Assim, a pergunta filosófica é: você aceitaria trocar um
triunfo profissional tremendo
por um golpe pessoal pesado?
Por um lado, um Oscar não é
de se jogar fora. Sandra Bullock
conquistou a admiração de
seus pares de uma maneira que
poucas pessoas chegam a fazer.
Ela ganhará mais dinheiro durante anos. É possível que ela
até viva mais tempo. Uma pesquisa constatou que os premiados com o Oscar vivem em média quase quatro anos mais do
que os indicados ao Oscar que
não recebem o prêmio.
Mesmo assim, se você precisou de mais de três segundos
para refletir sobre essa pergunta, você está completamente
louco. A felicidade conjugal é
muito mais importante do que
qualquer outra coisa para determinar o bem-estar pessoal.
Se você tem um casamento
bem-sucedido, não importa
quantos reveses profissionais
sofrer, você será razoavelmente feliz. Se tiver um casamento
malsucedido, não importa
quantos triunfos tenha em sua
carreira -você se sentirá não
realizado, em grau importante.
Este não é um discurso vazio.
Nas últimas décadas, pesquisadores vêm estudando a felicidade. Seu trabalho, que inicialmente pareceu inconsistente,
desenvolveu um rigor impressionante, e uma das descobertas importantes é que, como
previam os sábios do passado, o
sucesso no mundo tem raízes
superficiais, enquanto os laços
interpessoais permeiam tudo.
Um exemplo: o vínculo entre
felicidade e renda é complicado
e tênue. É fato que os países pobres se tornam mais felizes à
medida que se tornam países
de classe média. Mas, alcançada a satisfação das necessidades básicas, há pouca ligação
entre a renda futura e o bem-estar. Os países em crescimento são ligeiramente mais felizes
do que os países com índice de
crescimento mais baixo.
Riqueza
Os EUA hoje são muito mais
ricos do que há 50 anos, mas o
aumento na riqueza não gerou
aumento mensurável na felicidade de seus habitantes.
Em escala pessoal, o fato de
ganhar a loteria não parece gerar ganhos duradouros em matéria de bem-estar. As pessoas
não são mais felizes durante os
anos em que conquistam mais
promoções no trabalho. Elas
são felizes na casa dos 20 anos;
essa felicidade diminui na
meia-idade e, em média, as pessoas alcançam seu pico de felicidade logo depois de se aposentarem, aos 65 anos.
A felicidade das pessoas aumenta ligeiramente conforme
a renda sobe, mas isso depende
de como elas vivenciam o crescimento. Sua riqueza acirra expectativas irrealistas? Desestabiliza relações consolidadas?
Ou flui de um círculo virtuoso
no qual um trabalho interessante gera trabalho árduo que,
por sua vez, conduz a mais
oportunidades interessantes?
Se a relação entre dinheiro e
bem-estar é complicada, a correspondência entre relacionamentos pessoais e felicidade
não o é. As atividades cotidianas mais associadas à felicidade
são o sexo, os encontros sociais
depois do trabalho e os jantares
com outras pessoas. A atividade cotidiana mais prejudicial à
felicidade é o deslocamento de
ida e vinda do trabalho.
Segundo um estudo, participar de um grupo que se reúne,
mesmo que seja apenas uma
vez por mês, gera o mesmo ganho de felicidade que uma pessoa tem quando dobra sua renda. Para outro estudo, ser casado gera um ganho psíquico
equivalente a mais de R$ 180
mil por ano. A impressão deixada por essa pesquisa é que o sucesso econômico e profissional
existe na superfície da vida e
que ele emerge dos relacionamentos interpessoais, que são
mais profundos e importantes.
Outra impressão é que prestamos atenção às coisas erradas. A maioria das pessoas superestima o grau em que mais
dinheiro poderia melhorar
suas vidas. A maioria das escolas e faculdades passa tempo
demais preparando seus alunos
para a vida profissional e tempo
insuficiente preparando-os para tomar decisões sociais.
A maioria dos governos divulga toneladas de dados sobre
tendências econômicas, mas
não divulga informações suficientes sobre a confiança e outras condições sociais. Em suma, as sociedades modernas
desenvolveram instituições
imensas orientadas às coisas
que são fáceis de contabilizar,
mas não às coisas que são mais
importantes. Elas têm afinidade com as preocupações materiais e um medo primordial das
preocupações morais e sociais.
Tradução de CLARA ALLAIN
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Atriz de "Juno" estrela filme sobre patinadoras Índice
|