São Paulo, segunda-feira, 04 de junho de 2007

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Ravi Coltrane encara a sombra do pai no jazz

Saxofonista se apresenta no Brasil e diz estar em busca de um estilo pessoal

Músico fala sobre o material que deve entrar nos shows no país e afirma que os artistas de hoje são mais realistas do que no passado

CARLOS CALADO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Não é fácil seguir a mesma profissão do pai, ainda mais se ele for um ídolo quase sagrado, como o saxofonista John Coltrane (1926-1967). É com essa sombra que o norte-americano Ravi Coltrane, 41, vem lidando desde o início dos anos 80, quando decidiu encarar o mesmo instrumento do pai e se tornar músico de jazz.
Atração do festival Bourbon Street Jazz Nights, amanhã, em São Paulo, e do Rio das Ostras Jazz & Blues Festival (Rio de Janeiro), nos dias 8 e 9, Ravi surpreende pela extrema humildade. Mesmo depois de tocar e gravar com diversos jazzistas de primeira linha, além de já ter lançado quatro álbuns, ele ainda não considera que já desenvolveu um estilo pessoal.
"Não acho que já tenha encontrado minha própria voz, realmente, na música", disse à Folha, por telefone, de Nova York, onde vive. "Sinto que ainda estou no caminho para essa descoberta pessoal. Ainda tenho muito trabalho pela frente, tenho muito para aprender."
Quem ouvir "In Flux", seu último álbum, ainda inédito por aqui, vai estranhar essa afirmação. Mais maduro do que em sua primeira aparição no Brasil (no Free Jazz Festival, em 2000), Ravi mostra ter evoluído bastante. Seus improvisos ganharam consistência. As composições são mais originais. Seu fraseado e sonoridade já não lembram tanto Joe Henderson ou Wayne Shorter.
Ravi fala pouco sobre o pai. Tinha só dois anos quando ele morreu, no auge da carreira, em decorrência de um câncer no fígado. Na verdade, sua primeira grande influência musical foi sua mãe, a pianista Alice Coltrane, cuja morte, em janeiro último, ainda parece abatê-lo profundamente.
"Os últimos meses sem minha mãe foram muito difíceis e confusos para mim. Ela era uma pessoa muito forte que enfrentou grandes perdas na vida. Perdeu os pais e o marido aos 30 anos. Perdeu meu irmão, morto em um acidente de carro. Mesmo enfrentando tantas perdas, ela seguiu em frente, sempre com muita força", relembra o músico.
Ravi admite que, desde a morte da mãe, não tem conseguido se concentrar como gostaria na preparação de seu novo disco. Nessa gravação, vai contar com Luis Perdomo (piano), Drew Gress (baixo) e E.J. Strickland (bateria), os mesmos músicos que participaram do álbum "In Flux" e vão acompanhá-lo em seus shows no Brasil.
"Temos tocado coisas de minha autoria, incluindo material que ainda não foi gravado, além de composições de outros músicos da banda", diz o saxofonista, avisando que não costuma tocar standards. "De vez em quando, tocamos alguma coisa de minha mãe ou de meu pai, mas tentamos manter o foco sobre nossa própria música."
Sobre a cena atual do jazz, Ravi admite que não tem tido muito tempo para acompanhar o que acontece nos clubes de Nova York, mas acha que os músicos de hoje revelam um senso de realidade maior do que no passado.
"A ambição de virar astro do jazz, de se ver em capas de revistas ou de conquistar garotas contribuiu para que muitos perdessem o rumo", comenta. "Os músicos de hoje sabem que o estrelato é uma fantasia. Você tem que tocar porque ama a música, não pelo que espera ganhar com ela. Hoje os músicos tocam com mais sinceridade, tentam ser mais pessoais, em vez de copiar o que faz sucesso", conclui.

RAVI COLTRANE


Quando: amanhã, às 22h
Onde: Bourbon Street (r. dos Chanés, 127, Moema, São Paulo; tel. 0/xx/11/ 5095-6100)
Quanto: R$ 95 (antecipado); R$ 120 (no dia)



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