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TV PAGA
Cinemascope: a contemplação dos espetáculos
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
E ntendemos as superproduções em cinemascope como uma forma de Hollywood se
defender dos avanços da televisão
em seu território -o que é indubitável.
Improvável, contudo, é que este
seja o único sentido do uso da tela
larga e do gosto pelos superespetáculos entre os anos 50 e 60. Nesse período, os europeus haviam
assumido as rédeas do cinema,
tomando o tempo como dimensão essencial.
O cinema não era mais apenas
imagens em movimento. Era a
imagem do tempo. Isso é perceptível no neo-realismo, especialmente em Rossellini, e depois em
Antonioni -entre tantos outros.
Ora, na América, o cinema continuava sendo movimento. Mesmo em Hawks, o mais ousado dos
cineastas americanos em todos os
tempos, o tempo decorre da ação.
A superprodução em cinemascope é que, com sua grandiosidade,
terá o dom de libertar o tempo.
Hoje temos a oportunidade de
observar, entre outras coisas, o
enterro de Marco Aurélio em "A
Queda do Império Romano"
(Telecine Classic, 21h). Quantos
minutos dura? Há os personagens
e a figuração. Há Cômodo e Lívio,
os possíveis sucessores, há Sofia
Loren de negro e há o vento que
os flocos de neve tornam visível.
Há as panorâmicas magníficas de
Anthony Mann -quem melhor
do que ele descortina a paisagem
com o movimento panorâmico?
Como essas panorâmicas incidiam sobre grandes exércitos em
movimento ou sobre cenários
magníficos, a dimensão temporal
acaba se introduzindo e, insidiosamente, tomando conta do filme. Não só deste, é claro: tanta
grandiosidade -cenários, figurantes etc.- exigem ser vistos, e
isso não se faz no vapt-vupt.
Assim, talvez, o tempo acaba se
instalando como dimensão essencial no cinema americano, no
mais insuspeito, tornando-se fator de modernização, libertando
os demais cineastas das amarras
da ação (por incrível que pareça) e
permitindo a um público enorme
o prazer da contemplação.
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