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São Paulo, terça-feira, 04 de novembro de 2003

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CINEMA

Mostra "Arte da África" traz 58 filmes, com destaque para os documentários e para o senegalês Djibril Diop Mambety

Continente africano se espalha pelas telas cariocas

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA

Enquanto o presidente Lula vai à África, parte da África está no Brasil, espalhada pelo CCBB do Rio em um grande evento que inclui exposição, shows, peças de teatro e, a partir de hoje, também uma ampla mostra de cinema, possivelmente a maior já feita no país com os filmes do continente.
Em cartaz até 16 de novembro, "Arte da África - Um Cinema para o Século 21" exibirá 58 títulos de 17 países diferentes, com destaque para a retrospectiva completa do cineasta senegalês Djibril Diop Mambety, morto em 1998, e uma impressionante demonstração de força do documentário africano com 23 longas e curtas.
Dois desses documentários vêm do Cabo Verde, um dos países-irmãos do Brasil pelo passado da colonização portuguesa: "Amilcar Cabral", de Ana Ramos Lisboa (que tem sua primeira exibição amanhã), um retrato simples e eficiente do líder do processo de independência do país, e o ótimo "Rabelados - Os Rebeldes Não-Violentos da Ilha de Cabo Verde", de Torsten Truscheit e Ana Rocha Fernandes (na terça), que foca em um grupo que resistiu à colonização portuguesa recusando-se a abrir mão da sua cultura.
Essa resistência resultou em prisão, tortura, morte e exílio, principalmente durante os anos da ditadura de Salazar, num processo que durou até a independência da ilha, em 1975.
"Em Cabo Verde, a história dos Rabelados é desconhecida pela maior parte da população e até hoje circulam propagandas negativas sobre a comunidade. Queríamos saber quem são os Rabelados e por que esse grupo, a maior parte dele de camponeses, foi tão perseguido durante a época colonial", diz Fernandes, cineasta caboverdiana que co-dirigiu o filme com o alemão Truscheit.
"A luta dos Rabelados nunca foi armada, mas sim mental. Eles achavam que a única forma possível de conseguir se livrar do subjugo colonial seria treinar viver com o mínimo indispensável, que deveriam ser produtos que eles mesmos produzissem."
O achado do filme está em não impor uma resposta para questões que levanta. É o próprio contato com os Rabelados, que ainda hoje vivem em comunidades isoladas, que mostra quem eles são.
Mas como romper o isolamento de uma comunidade tão fechada e ao mesmo tempo respeitá-la? "O filme só foi possível porque tivemos muito tempo de preparação. A fase de pesquisa durou dois anos, e a filmagem, quatro meses. O tempo foi importante para estabelecer uma relação de confiança", diz Truscheit.
Segundo o cineasta, que apresentou o filme como tese para a Academia de Cinema de Ludwigsburg, foi uma preocupação máxima que, durante as filmagens, o ritmo da vida dos Rabelados influenciasse o trabalho da equipe, e não o contrário.
"Os Rabelados acharam engraçado que nós esperássemos a melhor luz para filmar. Era algo idêntico à forma de eles trabalharem, pois também esperam fases da lua para determinados tipos de trabalho", diz Truscheit. Ao que Fernandes lembra: "Há um provérbio caboverdiano que diz: "É na manso, manso ki mininu bonitu ta fasedo", que significa: é no devagar que se faz filhos bonitos...".


ARTE DA ÁFRICA - UM CINEMA PARA O SÉCULO 21. Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Primeiro de Março, 66, Rio de Janeiro, tel. 0/xx/21/3808-2020). Quando: abertura hoje, às 19h. Até 16/ 11. Quanto: R$ 8.


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