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TEATRO/CRÍTICA
Mostra do Sesi polariza Nordeste entre céu e inferno
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Tendo como tema principal
a nova dramaturgia nordestina, a Mostra de Dramaturgia
Contemporânea do Sesi esta semana apresenta duas peças cujos
temas são mais tradicionalmente
ligados à região.
"Braseiro", do cearense Marcos
Barbosa, trata de jura de morte
em uma briga de vizinhos; "Coiteiros de Paixões", do pernambucano Luiz Felipe Botelho, mostra
o cotidiano em um fictício esconderijo de cangaceiros. No entanto,
o tratamento dos temas escapa ao
folclórico pela radicalização do
tom, que os encenadores souberam ressaltar ao máximo. Neste
programa duplo, portanto, o que
se observa é o inferno e o céu na
terra do sol.
O texto de Marcos Barbosa tem
uma rusticidade sem concessões.
As personagens não possuem nome: um homem aguarda notícias
do filho mais velho, que foi pego
roubando boi de seus vizinhos jagunços e, depois, condenado a ser
queimado vivo. Os diálogos são
secos, as esperanças giram em falso, e a angústia crescente vai tomando uma densidade de tragédia grega.
Amparada por Daniela Thomas, cujo cenário-instalação tem
uma ancestralidade que remete
ao seu trabalho junto a Gerald
Thomas, a diretora Débora Dubois corre todos os riscos. Põe nos
atores uma voz gutural, muito
abaixo do confortável, e uma
marcação rígida e estilizada, como a do teatro japonês. A garra
com que o elenco encara o desafio
honra o projeto do Teatro Promíscuo, baseado, antes de tudo,
na versatilidade do ator. O público, atônito, sufoca risos nervosos;
alguns se irritam e saem, mas não
há indiferença: feita para incomodar, ultrapassando a fronteira do
ridículo para estabelecer um estranho universo grotesco, "Braseiro" é uma peça instigante e desconfortável.
Para o público que supera a provação, a peça seguinte, "Coiteiros
de Paixões", é um bálsamo. A aridez da brasa dá lugar à utopia de
um rio subterrâneo no meio do
sertão, em um lugar secreto perfeito para um esconderijo de cangaceiros, um "coito". O termo logo ganha um duplo sentido simbólico.
Pelos olhos do foragido Epitácio
(em delicada interpretação de
Ariel Borghi), vamos descobrindo
esta mistura de Macondo com a
floresta de Sherwood, uma comunidade pansexual na qual o cangaceiro-travesti Carmen Lúcia
(Elcio Seixas, impagável) convive
com Aurora, que só anda nua
(Valéria Pontes, desenvolta diante da efervescente platéia do Sesi)
e o padre Hauser, sob medida para o anarquismo de Renato Borghi, que opta por trocar a hóstia
pela maçã, em uma grande idéia
da diretora.
A diretora Johana Albuquerque
endossa apaixonadamente o tom
de fábula do texto, encenando
narrativas, usando ao máximo o
cenário simples e versátil, sem
nunca cair no deboche. Afinal, a
ternura é o maior prêmio da subversão, como parece afirmar o
texto do dramaturgo Luiz Felipe
Botelho, um autor a ser acompanhado de perto.
Braseiro
Coiteiros de Paixões
Onde: Teatro Popular do Sesi (av.
Paulista, 1.313, SP, tel. 0/xx/11/3146-7405)
Quando: de hoje a dom., às 20h30
Quanto: entrada franca
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