São Paulo, quinta-feira, 04 de dezembro de 2008

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"S.Bernardo" ainda opera milagres

Cópia restaurada do filme de 1972, de Leon Hirszman, foi exibida na noite de terça, antes de um debate

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Nem mesmo uma acidental inversão de rolos durante a exibição foi capaz de reduzir o brilho da apresentação em película da cópia restaurada de "S.Bernardo", anteontem à noite, promovida pela Folha e pelo Cine Bombril, em São Paulo.
O evento marcou o lançamento pela Videofilmes do segundo volume em DVD da coleção Leon Hirszman, que reúne, além do longa de 1972, adaptação do romance de Graciliano Ramos, quatro documentários de curta-metragem: "Maioria Absoluta" (1963) e a trilogia "Mutirão", "Cacau" e "Cana-de-Açúcar", que compõe a série "Cantos de Trabalho", feita por Hirszman entre 1974 e 1976. Para 2009, está previsto o DVD da cópia restaurada de "A Falecida" (1965) e, para 2010, "Imagens do Inconsciente" (1987).
A desordem técnica que provocou uma alteração na linearidade do relato durante a exibição foi apontada e reparada pelos participantes do debate que se seguiu à projeção. Conduzido por Sérgio Rizzo, crítico da Folha, a conversa teve a participação de Lauro Escorel, fotógrafo do filme, do ator Othon Bastos, que protagoniza a adaptação como Paulo Honório, e do professor da USP e ensaísta Ismail Xavier.
Escorel e Bastos rememoraram detalhes da feitura do filme, como o rígido controle imposto por Hirszman nos ensaios e na organização técnica, já que as filmagens foram feitas com baixíssimo orçamento e contavam com um estoque de negativos limitado mesmo para os padrões brasileiros da época. Bastos preferiu amenizar a imagem rígida de Hirszman, lembrando que sua direção de atores era firme, mas conduzida com doçura.

Rigor formal
Os esclarecimentos endossavam o que acabava de ser projetado: um filme marcado por austeridade e despojamento máximos e no qual a graça pictórica e a força das interpretações não se inserem de modo a desviar nossa atenção.
Este rigor formal foi o foco da exposição de Ismail Xavier, que abriu sua intervenção apontando os vínculos entre o cinema novo e a literatura brasileira, aproximação por meio da qual os cineastas daquela geração buscaram "uma proposta de intervenção política e uma reflexão sobre a história e as mazelas sociais do país".
"Politização que em "S.Bernardo'", explicitou Xavier, "emerge com o tom fúnebre da música de Caetano Veloso e com as figuras femininas que ilustram os créditos de abertura e que se revelam desenhos de uma nota de mil réis".
"Em pleno milagre brasileiro, Hirszman encerra o filme com imagens em estilo documental de indivíduos que nos olham diretamente como a dizer que, se havia algum milagre, não era ali que acontecia", arrematou. Milagre mesmo foi o que se viu na tela do Bombril.


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