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No tabuleiro da baiana
Bolinho de feijão-fradinho frito no azeite-de-dendê, o acarajé pode ser encontrado em São Paulo em uma variedade de recheios e temperos
LUIZA FECAROTTA
DO GUIA DA FOLHA
Enquanto cantarola, dona
Neide Sena Avelino frita seus
acarajés em um pequeno espaço, que lembra uma garagem
adaptada. Há seis meses, essa
baiana trocou Salvador por São
Paulo especialmente para preparar os bolinhos do Point do
Acarajé, na Bela Vista.
Os clientes se acomodam
com simplicidade nas três cadeiras de plástico, separadas de
sua "cozinha" por uma mesa,
onde apóia pimenta e guardanapos. Ali, fica à vista uma panela com dendê sobre um fogareiro. A massa é preparada em
sua casa, depois das compras
que faz regularmente no Brás.
Por R$ 3, come-se um acarajé
com recheio farto -vatapá, vinagrete de tomate-verde e cebola. Com mais R$ 1, pode-se
acrescentar os pequenos camarões secos, que escorregam por
todos os lados.
O bolinho que fez fama nos
tabuleiros das baianas de Salvador, que tiveram seu ofício registrado como patrimônio nacional pelo Iphan (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 2001, também pode ser encontrado em
São Paulo em versões nas quais
variam a intensidade do sabor
(para adequar a receita ao gosto paulistano), os recheios e os
preços. Feito de feijão-fradinho, temperado normalmente
com cebola e sal e frito no azeite-de-dendê, aparece em opções para comer com a mão e
também nos cardápios de restaurantes -servidos à mesa
com capricho e delicadeza.
Bola de fogo
"Bolinho de comer", na língua iorubá, o acarajé também é
conhecido simbolicamente como "comer bola de fogo", segundo o antropólogo Raul
Lody, autor de livros como
"Brasil Bom de Boca". Recheado ao gosto do freguês com camarão seco, salada de tomate-verde e cebola, vatapá e caruru
-estes últimos eternizados pela canção de Ary Barroso na voz
de Carmem Miranda-, normalmente é temperado com
molho grosso de pimenta.
Na receita da baiana Vanda
Barreto, que descobriu sua vocação depois de trabalhar como
metalúrgica e sacoleira, o vatapá leva em sua base "creme de
pão francês amanhecido, molhado em caldo de cabeça de
peixe, castanha-de-caju, amendoim, camarão seco defumado,
camarão fresco, posta de cação,
cebola, alho, gengibre, leite de
coco e dendê". É servido em seu
restaurante Barra Baiana, na
companhia dos bolinhos.
Na saída do Rota do Acarajé,
"boteco" na Bela Vista, um cozinheiro pica o quiabo com
concentração -em média, a casa usa 40 kg por semana para
preparar o caruru. "Aqui, começamos com uma baiana fazendo acarajé na porta e uma
geladeira de cerveja", conta a
proprietária Luisa Saliba, que
recebe alguns ingredientes de
Salvador. "O grande segredo do
acarajé é o preparo da massa.
Tem que estar clara, cremosa e
boiar no dendê." O feijão-fradinho é pré-preparado em sua casa: "Tenho uma pia exclusiva
para isso, temos que descascar
o feijão na água corrente, é um
processo bem artesanal. Depois, passamos o moinho e levamos para o restaurante".
No Mestiço, o bolinho ganha
outra versão. Com massa vinda
de Salvador, enviada congelada
todo mês por dona Alaíde, que
tem uma barraca do quitute no
bairro de Ondina, o acarajé é
servido em porções, a preços altos -R$ 9, com duas pequenas
unidades, ou R$ 16, com quatro.
Dispensa, no entanto, o vatapá, o caruru e o camarão seco,
que é usado apenas para preparar o molho que o acompanha,
bastante apimentado, que também leva camarões frescos, para ficar mais leve, purê de cebola, gengibre e dendê. Segundo a
chef Ina de Abreu, é preciso ficar atento à massa, batida na
mão com colher de pau até ficar
aerada e branquinha. "Para fritar, coloque na panela uma cebola inteira, com casca, que evita que o óleo queime muito rápido", sugere a chef.
Outra alternativa para comer
com conforto é o restaurante
Brasil a Gosto, da chef Ana Luiza Trajano, que se inspirou na
feira de São Joaquim para incorporá-lo em seu menu. Apresentado de forma delicada, os
miniacarajés podem ser acompanhados de caruru, vatapá, camarão seco, vinagrete e um picante molho de pimenta.
Por preço mais acessível
-em ambiente simples e caseiro, com atendimento informal-, os acarajés do Soteropolitano, na Vila Madalena, custam R$ 15, seis unidades com os
recheios (vatapá, caruru, vinagrete, camarão seco e pimenta,
servidos separadamente), e demoram a chegar à mesa.
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