São Paulo, quinta-feira, 04 de dezembro de 2008

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No tabuleiro da baiana

Bolinho de feijão-fradinho frito no azeite-de-dendê, o acarajé pode ser encontrado em São Paulo em uma variedade de recheios e temperos

LUIZA FECAROTTA
DO GUIA DA FOLHA

Enquanto cantarola, dona Neide Sena Avelino frita seus acarajés em um pequeno espaço, que lembra uma garagem adaptada. Há seis meses, essa baiana trocou Salvador por São Paulo especialmente para preparar os bolinhos do Point do Acarajé, na Bela Vista.
Os clientes se acomodam com simplicidade nas três cadeiras de plástico, separadas de sua "cozinha" por uma mesa, onde apóia pimenta e guardanapos. Ali, fica à vista uma panela com dendê sobre um fogareiro. A massa é preparada em sua casa, depois das compras que faz regularmente no Brás. Por R$ 3, come-se um acarajé com recheio farto -vatapá, vinagrete de tomate-verde e cebola. Com mais R$ 1, pode-se acrescentar os pequenos camarões secos, que escorregam por todos os lados.
O bolinho que fez fama nos tabuleiros das baianas de Salvador, que tiveram seu ofício registrado como patrimônio nacional pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 2001, também pode ser encontrado em São Paulo em versões nas quais variam a intensidade do sabor (para adequar a receita ao gosto paulistano), os recheios e os preços. Feito de feijão-fradinho, temperado normalmente com cebola e sal e frito no azeite-de-dendê, aparece em opções para comer com a mão e também nos cardápios de restaurantes -servidos à mesa com capricho e delicadeza.

Bola de fogo
"Bolinho de comer", na língua iorubá, o acarajé também é conhecido simbolicamente como "comer bola de fogo", segundo o antropólogo Raul Lody, autor de livros como "Brasil Bom de Boca". Recheado ao gosto do freguês com camarão seco, salada de tomate-verde e cebola, vatapá e caruru -estes últimos eternizados pela canção de Ary Barroso na voz de Carmem Miranda-, normalmente é temperado com molho grosso de pimenta.
Na receita da baiana Vanda Barreto, que descobriu sua vocação depois de trabalhar como metalúrgica e sacoleira, o vatapá leva em sua base "creme de pão francês amanhecido, molhado em caldo de cabeça de peixe, castanha-de-caju, amendoim, camarão seco defumado, camarão fresco, posta de cação, cebola, alho, gengibre, leite de coco e dendê". É servido em seu restaurante Barra Baiana, na companhia dos bolinhos.
Na saída do Rota do Acarajé, "boteco" na Bela Vista, um cozinheiro pica o quiabo com concentração -em média, a casa usa 40 kg por semana para preparar o caruru. "Aqui, começamos com uma baiana fazendo acarajé na porta e uma geladeira de cerveja", conta a proprietária Luisa Saliba, que recebe alguns ingredientes de Salvador. "O grande segredo do acarajé é o preparo da massa. Tem que estar clara, cremosa e boiar no dendê." O feijão-fradinho é pré-preparado em sua casa: "Tenho uma pia exclusiva para isso, temos que descascar o feijão na água corrente, é um processo bem artesanal. Depois, passamos o moinho e levamos para o restaurante".
No Mestiço, o bolinho ganha outra versão. Com massa vinda de Salvador, enviada congelada todo mês por dona Alaíde, que tem uma barraca do quitute no bairro de Ondina, o acarajé é servido em porções, a preços altos -R$ 9, com duas pequenas unidades, ou R$ 16, com quatro.
Dispensa, no entanto, o vatapá, o caruru e o camarão seco, que é usado apenas para preparar o molho que o acompanha, bastante apimentado, que também leva camarões frescos, para ficar mais leve, purê de cebola, gengibre e dendê. Segundo a chef Ina de Abreu, é preciso ficar atento à massa, batida na mão com colher de pau até ficar aerada e branquinha. "Para fritar, coloque na panela uma cebola inteira, com casca, que evita que o óleo queime muito rápido", sugere a chef.
Outra alternativa para comer com conforto é o restaurante Brasil a Gosto, da chef Ana Luiza Trajano, que se inspirou na feira de São Joaquim para incorporá-lo em seu menu. Apresentado de forma delicada, os miniacarajés podem ser acompanhados de caruru, vatapá, camarão seco, vinagrete e um picante molho de pimenta.
Por preço mais acessível -em ambiente simples e caseiro, com atendimento informal-, os acarajés do Soteropolitano, na Vila Madalena, custam R$ 15, seis unidades com os recheios (vatapá, caruru, vinagrete, camarão seco e pimenta, servidos separadamente), e demoram a chegar à mesa.


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