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Minha vontade é sair beijando, diz Benigni
CLAUDIO CASTILHO
especial para a Folha
"Ciao, bello!" Escuta-se uma voz
alta e distante que se aproxima
conforme o comediante Roberto
Benigni cruza o saguão do hotel
Marmont, em Los Angeles.
O cineasta italiano se apresenta
eufórico e sorridente à reportagem
da Folha, para uma conversa exclusiva sobre a sua mais recente
obra cinematográfica, o premiadíssimo filme "La Vita È Bella" ("A
Vida É Bela"), que entra em cartaz
hoje no Brasil. Leia trechos de sua
entrevista.
Folha - Você esperava uma repercussão tão grande de seu filme?
Roberto Benigni - Tinha uma certeza dentro de mim de que estava
fazendo o melhor filme possível. O
que sinto agora é uma emoção
muito forte ao receber tantos elogios das pessoas pelo meu trabalho. Sinto-me amado e necessitando retribuir toda essa maravilhosa
demonstração de amor. Quando
passo pelas ruas de Los Angeles,
Nova York ou qualquer outra cidade do mundo, a minha vontade é
sair beijando todo mundo como
forma de gratidão.
Folha - Na sua opinião, o que é
mais importante: tornar-se feliz ou
levar a felicidade aos outros?
Benigni - Sem dúvida fazer as
pessoas felizes primeiro. Essa relação de amor é inclusive o sentimento mais forte que tento passar
no filme. Busquei mostrar que o
amor, a imaginação e a liberdade
podem conquistar tudo nessa vida.
Infelizmente a tragédia pode acontecer em nosso caminho. Estamos
felizes e de repente uma reviravolta
inesperada ocorre e você deve estar preparado para enfrentá-la.
Folha - O que Roberto Benigni
mais aprecia em Guido?
Benigni - A maneira como ele
reage diante das dificuldades que
surgem em sua vida e na de sua família. É maravilhoso o jeito como
ele usa a imaginação própria e o
amor como armas de proteção da
inocência e pureza até mesmo das
pequenas coisas da vida. De certa
forma me acho um pouco parecido
com Guido. Estou sempre procurando encontrar o lado positivo
das coisas, especialmente nos momentos mais complicados.
Logicamente tenho que admitir
que jamais passei nem de longe
por circunstâncias tão trágicas como as vividas por Guido. Não sei
se, se eu estivesse na pele dele, a
minha reação seria a mesma.
Folha - Quando pensou na idéia
de usar o tema do Holocausto numa comédia, não passou por sua
cabeça a possibilidade de ser criticado por isso?
Benigni - O fato é que existe muito preconceito em relação aos atores que fazem comédia. Na cabeça
de muita gente, um comediante jamais deve falar de coisas sérias. É o
que eu chamo de racismo artístico.
Eu acho que muitas vezes somente os palhaços conseguem
atingir determinados pontos de
uma tragédia. Eles são os maiores
exemplos de pureza e inocência
que existe, por expressar tão brilhantemente as tragédias da vida.
Agora, quanto a críticas, eu já esperava porque trato no filme da
maior tragédia da história humana. Mas hoje eu me sinto gratificado em saber que as pessoas entenderam meu filme, inclusive a comunidade judaica.
Folha - Como você reage à possibilidade de "A Vida É Bela" ser indicado na categoria de melhor filme?
Benigni - Se isso realmente acontecer, eu acho que vou querer fazer
amor com todo mundo que cruzar
o meu caminho durante um mês
inteiro até o dia da festa do Oscar
(risos). Portanto, tome cuidado
(uma longa gargalhada).
Folha - E se por acaso você acabar levando o Oscar? Em Cannes,
por exemplo, você decidiu beijar
os pés de Scorsese. O que faria se
recebesse o Oscar agora?
Benigni - Não me diga isso, que
vou começar a pular como louco
aqui. Normalmente eu não preparo discursos e falo com meu corpo,
já que um momento desses é tão
maravilhoso que as palavras saem
naturalmente.
Folha - Voltando ao filme, como
foi que você encontrou o garoto
que faz o papel de Giosué?
Benigni - Confesso que não foi tarefa fácil. Já havia conversado com
mais de mil garotos, muitos deles
bons para outros papéis, mas não
para encarnar Giosué. Foi quando
surgiu Giorgio Cantarini, um verdadeiro presente dos céus.
Ele ia me encontrar acompanhado da mãe, mas acabou decidindo
ir sozinho. Vestia um longo casaco,
que mais parecia uma roupa de palhaço. Contou-me que na noite anterior ao nosso encontro ele havia
tido um sonho no qual eu me aproximava e dizia: "Você vai ser meu
filho no próximo filme". A maneira que ele narrou o sonho me conquistou de imediato. Giorgio possuía luz idêntica à de Giosué.
Folha - "A Vida É Bela" e "Central
do Brasil" possuem duas coincidências: os meninos têm o mesmo
nome (Giosué e Josué) e as mulheres também (Dora em ambos).
Benigni - Incrível, mas é pura
coincidência. Garanto que não foi
nada combinado entre mim e Walter Salles. Pode até perguntar a ele
(risos). Mas de qualquer maneira é
uma coincidência e tanto!
Folha - Você assistiu a "Central"?
Benigni - Infelizmente ainda não.
Muita gente tem me falado muito
bem do filme. Estou louco para
ver. Essa é uma das coisas que quero fazer quando voltar à Itália, já
que "Central do Brasil" também
está sendo exibido por lá.
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