São Paulo, sábado, 05 de março de 2005

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LIVROS

NOVO JORNALISMO

Coletânea lembra textos de Hunter Thompson e Capote

Estilo de Wolfe, "Balzac de NY", dá saudade, mas não tem volta

Reprodução
Panteras Negras, em Nova York (EUA), militantes que foram retratados em "Radical Chique"


CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

O lançamento de "Radical Chique e o Novo Jornalismo", uma coletânea de textos diversos antes publicados em três livros de Tom Wolfe, e a morte de Hunter Thompson fizeram com que muitos jornalistas brasileiros refletissem sobre um dos movimentos mais importantes da história de sua profissão: o novo jornalismo, do qual Wolfe e Thompson foram expoentes.
Manifestação típica da inquietação cultural das décadas de 1950 e 1960 nos EUA, o novo jornalismo teve repercussão mundial, como seus assemelhados contemporâneos de outras áreas de manifestação artística ou intelectual.
A idéia era basicamente que o repórter tivesse grande (ou total) liberdade estilística para contar suas histórias, fugir dos padrões convencionais do texto jornalístico, enriquecê-lo com recursos antes considerados exclusivos da ficção. Mas era preciso manter fidelidade (embora não necessariamente absoluta) aos fatos reais apurados pelo jornalista.
O apelido de "Balzac da Park Avenue" dado a Wolfe era bastante apropriado. O francês foi uma espécie de precursor do novo jornalismo, com a descrição atilada e elegante que fez dos salões de Paris da primeira metade do século 19, similar à que Wolfe fez da Nova York da segunda metade do século 20.
O livro é mais um excelente serviço que a coleção Jornalismo Literário presta à profissão no Brasil. É fundamental para os que a praticam conhecer os grandes textos que a tornaram, mais do que socialmente relevantes, culturalmente aprazíveis.
A admiração por Wolfe, Thompson, Truman Capote e outros, no entanto, não deve levar a conclusões irreais e saudosistas do tipo "é de reportagens do tipo "A Garota do Ano" ou "A Sangue Frio" que o jornalismo precisa para superar sua crise".
Em primeiro lugar, o novo jornalismo foi um fenômeno que -apesar de ter provocado efeitos em diversos países, inclusive o Brasil- dificilmente poderia se reproduzir com intensidade similar à que teve nos EUA fora daquele país e daquela época.
Tratava-se de uma produção dispendiosa, só sustentável por uma indústria abastada. Esse foi um dos motivos pelos quais ele jamais se aproximou no Brasil da envergadura que teve nos EUA. Apesar de alguns jornalistas e veículos terem produzido reportagens memoráveis que nada deviam em talento às dos mestres. Para citar apenas uma pessoa, sob o risco de cometer injustiças, Marcos Faerman.
Mas o sucedâneo do movimento no Brasil foi, sem dúvida, constituído de peças muito mais isoladas do que as que formaram o original americano, as quais já eram ostensivamente exceções à regra.
Além da dificuldade material de sustentar reportagens desse gênero -que se agravou a níveis muito mais intensos-, houve alterações profundas no mercado e nos hábitos dos consumidores de informação, que tornam complicada a aceitação de produtos como essas grandes reportagens na mídia impressa. Por isso, vale ler Wolfe em livro. Mas não se deve alimentar ilusões sobre o retorno de seu estilo aos jornais e revistas.


Carlos Eduardo Lins da Silva é jornalista e diretor da Patri Relações Governamentais e Políticas Públicas

Radical Chique e o Novo Jornalismo
    

Autor: Tom Wolfe
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 39 (248 págs.)


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