São Paulo, quinta-feira, 05 de setembro de 2002

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Para ver a menina

Marco Antonio Rezende/Folha Imagem
A carioca Teresa Cristina, 34, que grava disco duplo de samba com clássicos de Paulinho da Viola



Artista retoma tradição de cantoras de samba e prepara CD para Paulinho da Viola


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Teresa Cristina canta samba e está gravando um CD, que vai sair em outubro. A frase parece banal, mas esconde um tesouro: há quanto tempo não se ouve surgir no Brasil uma cantora de samba, daquelas como foram Aracy de Almeida lá no começo do século 20, Elza Soares na década de 60, ou a trindade dos 70 Clara Nunes/Beth Carvalho/Alcione?
Teresa, carioca de 34 anos, interrompe um jejum que se estende desde pelo menos a pagodeira oitentista Jovelina Pérola Negra, interrompido só em parte pelas cantoras de axé, o samba miscigenado baiano dos anos 90.
Vem lançar, pela gravadora independente Deck Disc, um disco duplo -28 canções- baseado integralmente no repertório de Paulinho da Viola, 59, o maior modernizador do samba na música brasileira pós-bossa nova, com "Coisas do Mundo, Minha Nega" (68), "Foi um Rio Que Passou em Minha Vida" (70), "Para Ver as Meninas" (71) e outras.
Herdeira e discípula de Paulinho, Candeia e Cartola, Teresa se une à recente reelaboração de carreira de Mart'nália, 36, filha de Martinho da Vila, que por sua vez encarnou a face mais sorridente, festiva e popular da renovação proposta por Paulinho da Viola. E o samba volta a ter voz feminina.

Talento tardio
Hoje se apresentando em casas do Rio toda quinta, sexta e sábado, Teresa se descobriu cantora e compositora tarde, aos 29 anos. Filha de feirante, antes da música seguiu rotina de menina pobre:
"Fui auxiliar de escritório e vendedora de margarina na rua, mas minha profissão mesmo, dos 13 aos 25, foi ser manicure. É o que sei fazer melhor, se me desse remuneração continuaria. Hoje tenho que me explicar para as pessoas "que história é essa de cantora?". Fico meio sem graça."
Pequena, Teresa dava risada do gosto musical do pai, quando ele ensacava limão ao som de Candeia, Roberto Ribeiro e "Índia" (73), de Gal Costa.
Ela refaz o trajeto: "Eu só ouvia música estrangeira, no colégio e em baile. Gostava de discothèque, Barry White, Earth, Wind & Fire. Ouvia "ioiô de iaiá" e não entendia, ficava rindo. Só mais velha comecei a gostar de samba, a partir do pagode dos anos 80, de Zeca Pagodinho e Almir Guineto".
"Eu era criança, não tinha querer. No samba as pessoas gostam de falar que ouvem desde criancinhas, mas comigo não foi assim. Tudo mudou quando reencontrei o disco do Candeia e fiz um túnel do tempo na minha vida: "Meu Deus, como é bom, e eu debochava disso". Fui ler a biografia dele, comecei a pesquisar, quis montar um show em homenagem."
O show não estreou até hoje, mas a colocou em contato com a música e com figuras do samba como Wilson Moreira e integrantes da Velha-Guarda da Portela.
"Passei a conhecer mais sambas, virei outra pessoa. "É isso que quero para a minha vida", pensei." E começou a cantar. Rapidamente cresceram, ao redor dela, o grupo Semente e o bar de mesmo nome, que tem movimentado o histórico bairro boêmio da Lapa.



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