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São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2003

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FESTIVAL DO RIO

...E DANOS


Auto-compaixão, medo e solidão habitam "A Espera", longa uruguaio em exibição


DENISE MOTA
EDITORA-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

Noite alta, subúrbio de Montevidéu. Na varanda de um edifício, uma mulher fuma enquanto percebe a juventude escoar entre os cuidados com a mãe -acamada há dez anos- e o trabalho atrás de uma máquina de costura. A poucos passos dali, um vizinho de meia-idade, insone, a observa e imagina maneiras de amenizar a angústia de mãe e filha.
O documentarista uruguaio Aldo Garay, 33, posiciona sua câmera entre esses dois apartamentos, e o resultado é "A Espera", primeiro longa-metragem de ficção do diretor, que tem exibição hoje no Festival do Rio.
Conhecido em seu país por retratos dos marginalizados de Montevidéu, caso de "Yo, la Más Tremendo" (documentário sobre a vida de travestis na capital), Garay faz de "A Espera" um relato ficcional com tons documentais. A câmera fixa e o corte seco produzem flashes de uma rotina composta de "medo, solidão, auto-compaixão, esperança", conforme elenca o diretor.
"Filmar de modo documental é uma maneira de ver as coisas com a qual me sinto muito à vontade e da qual gosto bastante", diz. "Além disso, em "A Espera" pude trabalhar dentro de um contexto social de classe média baixa, que é um cenário que conheço."
O filme é uma adaptação para as telas do romance "Torquator", de Henry Trujillo, e a trama oscila entre o drama e o policial, num estranho triângulo formado por duas mulheres cujas existências estão marcadas por danos irreparáveis -físicos, para a mãe; emocionais, para a filha- e por um solícito vizinho que se imiscui em suas vidas sem razão aparente.
"A Espera" foi rodado em duas semanas e custou US$ 100 mil -70% desses recursos vieram do Fona (Fundo Nacional para o Audiovisual), benefício coordenado pela Intendência (Prefeitura) de Montevidéu, e o restante, completado por outro prêmio (Ocic -°Oficina Católica de Cinema), cujos US$ 30 mil destinaram-se à pós-produção do longa.
Apesar de premiado nos festivais de San Sebastián, Miami, Los Angeles e Nantes, na terra natal o filme teve discreta carreira: ficou cinco semanas em cartaz e teve cerca de 8.000 espectadores.
Depois da experiência ficcional, Garay voltou ao documentário. Realiza agora uma série de reportagens com ex-jogadores de futebol célebres em seu país para a TV Ciudad, canal educativo no qual trabalha desde 98.
"O que me interessa são os limites que existem entre esses gêneros. Muitas vezes você assiste a um filme e não sabe se o que está vendo é uma ficção ou um documentário. O que importa é fazer cinema e ter interesses amplos. Interessa-me a vida", afirma.

General e pastor
Enquanto "A Espera" é exibido no Rio de Janeiro, seu produtor, José Pedro Charlo, está envolvido em outro projeto no país -a co-produção Brasil/Uruguai "Alma Mater". O filme terá no elenco o ator gaúcho Werner Schünemann -que ficou conhecido nacionalmente como o general Bento Gonçalves da minissérie global "A Casa das Sete Mulheres".
De acordo com Charlo, a escalação do ator veio antes de sua popularidade televisiva. "Queríamos alguém que tivesse o perfil adequado para o papel e já o conhecíamos", diz.
De oficial dos pampas, Schünemann incorpora agora um pastor. O longa, definido por seus realizadores como "uma fábula contemporânea com toques místicos", tem previsão de chegada aos cinemas uruguaios e brasileiros (com legendas) em maio do próximo ano. A estréia simultânea tem o objetivo de "coordenar um evento cultural entre Brasil e Uruguai, vincular São Paulo, Porto Alegre e Montevidéu", segundo Charlo.
Rodado em super 16, o filme é dirigido por Álvaro Buela e está na segunda das suas cinco semanas de filmagem, orçadas em US$ 150 mil. "Alma Mater" também contou com verba do Fona para sua produção, além de recursos da iniciativa privada. A finalização do longa será feita no Brasil.

A ESPERA. De: Aldo Garay. Com: Elena Zuasti, Verónica Perrota, Walter Reyno. Exibições hoje e dias 7 e 8 de outubro. Veja a programação completa do festival em www.folha.com.br/especial/2003/festivaldoriobr


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