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Viola fora de moda
O compositor Edu Lobo, que faz show em SP a partir de quarta, fala sobre sua vida e sua música após o aneurisma
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Edu Lobo, 61, faz show hoje em
Recife, onde ontem ganharia da
Câmara dos Vereadores o título
de cidadão pernambucano. Homenagem justa para esse carioca
filho de pernambucanos, mas a
cerimônia, o jantar com o governador e as entrevistas pouco combinam com sua discrição.
Discrição que pode aumentar
depois do aneurisma cerebral que
o levou, em 23 de agosto, a uma
delicada cirurgia. Ele diz que sente vontade de ficar mais calado.
Mas não faz drama. "Em nenhum
segundo achei que ia morrer."
Embora o preço do ingresso (R$
200) o incomode, tanta discrição
combina com o pequeno Baretto,
onde ele faz, a partir de quarta,
temporada de duas semanas. Vai
cantar músicas de toda a sua carreira, como sempre faz, voltando
e voltando a sua obra, com perfeccionismo. Rigor que o põe entre
os maiores compositores brasileiros. Bem menos popular do que
Chico Buarque, Caetano Veloso e
outros, por causa da tal discrição.
A soma das duas características
o leva a um cenário "quase ideal":
criar músicas em casa e comercializar na internet. Como entende
pouco de comércio, só garante
um dos lados: estará sempre
criando. Foi no estúdio de sua casa, que ele conversou anteontem
com a Folha.
Folha - O que mudou depois do
aneurisma?
Edu Lobo - Parece que o hard
disk [memória do computador]
ficou mais lento. Tem um nome
ou outro que não lembro.
Folha - Mudou emocionalmente?
Lobo - Estou com vontade de ficar meio quieto, mais calado. Eu
já era assim, mas não tanto.
Folha - Você teve a sensação de
estar perto da morte?
Lobo - Não. Eu só soube do meu
estado depois da cirurgia e pelo
[ator] Antônio Pedro, que entrou
na UTI não sei como. Ele chegou
para mim, com uma cara assustada, e perguntou: "Você sabe o que
tem? Aneurisma". Aí eu falei:
"Como você sabe?". "Está em todos os jornais." Eu levei um susto.
E realmente as pessoas estavam ligando muito, o que é estranho, e
meus filhos me visitando várias
vezes por dia, o que é mais estranho ainda. Em nenhum segundo
achei que podia morrer.
Folha - O que significa abrir o
show com "Berimbau" [de Baden
Powell e Vinicius de Moraes]?
Lobo - Tem um sentido de passeio pelo passado. Aprendi muito
com o Baden: esse violão para fora, percussivo. Já não era mais a
batida do João Gilberto. As pessoas aqui falam em bossa nova,
depois tropicália. Baden não é
bossa nova nem tropicália. Baden
é Baden. É um estilista, inventou
uma maneira de tocar violão.
Eu tenho certa implicância com
nome de escola, porque parece
que uma escola acabou e depois
começou outra. Já fui chamando
de inventor da MPB. Eu me senti
com 270 anos. Se eu fui inventor
da MPB, [Dorival] Caymmi é o
quê? Tem que inventar um nome
para o que ele faz? É tudo ligado.
Se eu, com 19 anos, fosse tocar
bossa nova naquelas casas que eu
freqüentava, com Tom [Jobim],
Carlinhos [Lyra], Baden, eu estava frito. Isso me levou a procurar
algo diferente para sobreviver.
Folha - E, com a sua geração, parece que se cria uma divisão entre
samba e MPB. Mas boa parte do
que você fez não é samba?
Lobo - Não é o samba tradicional, às vezes é o samba-bossa nova, como "Pra Dizer Adeus". Na
verdade, é uma mistura de samba,
baião, xaxado, mas com harmonia da bossa nova. Não tem muito
como dar nome. A gente tem tanta coisa no Brasil que não vejo necessidade de pegar nada [de fora].
Aqui tem tudo o que um compositor precisa para fazer uma música legal. Não quer dizer que você
não vá ouvir "coisas de fora", como se dizia. Mas, quando procuram uma música comercial que
não tem nada a ver com a cidade,
o país, fico sem entender.
Folha - Que música? Rock, rap?
Lobo - Um tipo de música que
não tem nada a ver com o Brasil, o
Rio. Porque nós fomos chegando
aqui a um nível muito sofisticado.
Folha - E você é perfeccionista...
Lobo - Mas não acho que seja
uma vantagem. O perfeccionista
nunca acha que as coisas estão
certas. Um certo perfeccionismo é
bom, empurra para frente, mas
assim, não é bom.
Folha - Como será o próximo CD?
Lobo - Estou pensando em alugar um estúdio, gravar e depois
ver se uma gravadora se interessa.
Não sei se é certo ou errado, mas
todo mundo caiu nisso.
Folha - Você acredita na viabilidade das pequenas gravadoras e
dos selos de artistas?
Lobo - Acho que é o que vai
acontecer. Isso vai terminar na internet, com as pessoas se produzindo, saindo do mercadão das
gravadoras e indo para um mercadão maior ainda, do mundo inteiro. É quase o ideal: produzir no
seu estúdio, jogar na rede e começar a chegar pedidos. Supondo
que seja um dólar por download:
se cem mil pessoas baixam sua
música, são cem mil dólares. Mas
não sei como seria recolhimento
de direitos autorais. Artisticamente, acho interessante.
Folha - Por que você acabou ficando nos bastidores, enquanto
Chico, Caetano, Gil se tornaram
muito mais populares?
Lobo - Tem a ver com show, aparição pública. Sempre achei que
existia essa profissão: compositor.
Se você descobrir que eu fiquei
dez anos sem fazer show, não tem
problema nenhum. Se descobrir
que eu fiquei dez anos sem fazer
música, aí é sério.
EDU LOBO. Onde: Baretto (r. Vittorio
Fasano, 88, Cerqueira César, SP, tel. 0/xx/
11/3896-4066). Quando: de 10 a 13/11 e
17 a 20/11, às 21h. Quanto: R$ 200.
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