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29ª MOSTRA DE CINEMA
Após dificuldades nas filmagens e "nãos" de distribuidores, cineasta é o primeiro brasileiro a vencer o evento com "Cinema, Aspirinas e Urubus"
Marcelo Gomes recebe o "sim" da Mostra
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Foram sete os anos que o cineasta Marcelo Gomes, 42, esperou
para ver terminado seu primeiro
longa-metragem, "Cinema, Aspirinas e Urubus" (2005).
Foram três os "nãos" que ele ouviu de grandes distribuidores brasileiros a quem propôs que lançassem seu filme nos cinemas.
Os executivos julgaram a história de dois retirantes no sertão
brasileiro, em 1942 -um alemão
que foge da Segunda Guerra e um
nordestino que tenta escapar da
seca-, sem atrativos ao público.
Foram incontáveis as vezes em
que Gomes ouviu de um interlocutor incrédulo a dúvida: "Mas
onde você encontrou um ator alemão [Peter Ketnath]?".
A pergunta conduzia o diretor
pernambucano a outra interrogação: "Será que alguém pergunta
ao Fernando Meirelles onde ele
encontrou [o ator inglês] Ralph
Fiennes [protagonista de "O Jardineiro Fiel", terceiro longa de Meirelles]?".
Foram todas essas lembranças
que brotaram, juntas e superpostas, na razão e na emoção de Gomes, quando ele ouviu "Cinema,
Aspirinas e Urubus" ser declarado vencedor da 29ª Mostra de SP,
anteontem, na cerimônia de encerramento do festival, no Memorial da América Latina.
Pela primeira vez, um filme nacional vencia a disputa, na decisão
de um júri insuspeito de patriotadas. Eram seis especialistas estrangeiros -da Argentina, Áustria, França, Portugal, Suécia e
Suíça- e dois brasileiros -o homem do mundo Fernando Meirelles e o respeitado jornalista e escritor Zuenir Ventura.
Embora "tudo tenha passado
pela cabeça", Gomes não mencionou as memórias duras em seu
agradecimento. Com frases pausadas, que sufocavam soluços esboçados, disse: "Eu queria ganhar
um prêmio de melhor filme só para uma coisa, para dedicá-lo à minha equipe".
No palco, o fotógrafo Mauro Pinheiro Jr., o diretor de arte Marcos Pedroso e a produtora Sara
Silveira aplaudiam. O diretor concluiu: "São co-autores comigo".
Demasiadamente singelo? Não.
Era a recusa consciente do cineasta de ceder ao (paralisante) triunfo do rancor. "Se eu guardar rancores, não faço mais nenhum filme", disse Gomes à Folha.
Igualmente econômico em palavras foi o documentarista
Eduardo Coutinho, 72, ao receber
o Prêmio Humanidade, homenagem à sua carreira. "Quem fala
demais fica besta. Então, muito
obrigado. É só isso."
Quem assistiu na Mostra ao
mais recente filme de Coutinho,
"O Fim e o Princípio", sabe que a
frase é referência ao que diz um
dos entrevistados.
Sutilmente, Coutinho, chamado
ao palco como "mestre", deixou
claro que continua aprendendo
com seus interlocutores do mundo real. O balanço da 29ª Mostra é
de não poucas lições.
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