São Paulo, sexta-feira, 06 de fevereiro de 2009

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Crítica

Filme nos induz a pensar como irmã Aloysius

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Mais do que zelosa por tudo o que acontece no colégio católico que dirige, no Bronx, em Nova York, a irmã Aloysius Beauvier (Meryl Streep) é obcecada por controle. A certa altura, visita a sala de aula e sugere um truque à professora, a jovem irmã James (Amy Adams).
Se ela pendurar um retrato do papa na lousa, explica a diretora, poderá controlar o que fazem às suas costas pelo reflexo no vidro da moldura. "Os alunos vão pensar que você tem olhos na nuca", diz. Irmã James aceita a dica e, na primeira oportunidade, impressiona com seus poderes extrassensoriais. A simbologia resume bem o desenho psicológico da protagonista de "Dúvida", escrito e dirigido pelo dramaturgo e ex-aluno (expulso) de colégio católico John Patrick Shanley ("Feitiço da Lua") com base em peça de sua autoria.
Irmã Aloysius acredita que tenha olhos na nuca e talvez cometa erro capital de julgamento: considerar que os reflexos de uma ação correspondem à própria ação quando, na verdade, representam o seu inverso. A crença a levará a investir contra o padre Flynn (Philip Seymour Hoffman), responsável pela paróquia da escola.
Ela não viu e não tem nenhuma prova conclusiva, mas está convicta de que ele cometeu assédio contra um aluno, o primeiro negro aceito pela instituição (estamos em 1964). Mais do que isso: tem a certeza de que o currículo limpo do padre esconde pecados. Como diz à irmã James, ela não se engana com as pessoas. Ou talvez se engane e provoque injustiças à sua volta? A sombra dessa suspeita paira do início ao fim, lançando o trio de personagens principais em pântano onde caminha também o espectador.
O que há de mais engenhoso em "Dúvida" talvez esteja no perigoso convite que faz ao público para que ele também se comporte como irmã Aloysius: emitir julgamentos sobre o que ocorre no colégio, com base apenas nas peças expostas pelo filme, equivale a também acreditar que se tem olhos na nuca.


DÚVIDA
Produção: EUA, 2008
Direção: John Patrick Shanley
Com: Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman, Viola Davis
Onde: estreia hoje nas salas Bristol 2, Espaço Unibanco Pompeia 6 e circuito
Classificação: não indicado a menores de 12 anos
Avaliação: bom



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