São Paulo, sexta-feira, 06 de fevereiro de 2009

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Última Moda

ALCINO LEITE NETO - ultima.moda@grupofolha.com.br

Olha o corte, rapaz!

Estilistas, como Ivan Aguilar, tentam colocar a alfaiataria outra vez na linha de frente da moda masculina

Houve um tempo em que moda masculina e alfaiataria eram sinônimos. Hoje, a alfaiataria foi praticamente relegada aos ternos de trabalho e tem que brigar muito com os jeans e a malharia industrial para encontrar um lugar no guarda-roupa dos rapazes brasileiros.
Apesar disso, grifes masculinas do país têm insistido em atualizar a velha arte de criar calças, camisas e paletós bem cortados, como demonstram as últimas semanas de moda e o trabalho de estilistas como Ricardo Almeida, Mario Queiroz, Lorenzo Merlino e, mais recentemente, João Pimenta. No último ano, designers que só se dedicavam à roupa feminina também decidiram criar moda masculina, como André Lima.
Mesmo as grifes de streetwear começaram a apresentar soluções novas para combinar a tradição da alfaiataria com a informalidade da época -como fazem Alexandre Herchcovitch, Osklen, V.ROM, Redley e Reserva, entre outras.
Um nome que desponta neste cenário de renovação é o de Ivan Aguilar, 45, mineiro que vive desde os sete anos em Vitória e foi um dos destaques do Fashion Rio. Ele é um dos raros exemplos de estilistas que têm forte formação em alfaiataria. "Todos disseram para eu parar com isso e começar a fazer roupa de malha, pois no Brasil é o que vende. Mas insisti, pois este é o meu tronco", diz.
Em 2002, antes de começar a desfilar, ele ganhou notoriedade ao fazer ternos para o presidente Lula e outros políticos, como José Sarney. "Foi uma fase agitada da minha vida, eu viajei a Brasília semanalmente, durante dois anos", conta Aguilar, que conheceu Lula numa viagem de avião e, depois, enviou-lhe um terno. "Tirei as medidas dele no olho", revela.
O presidente gostou e encomendou outros ternos ao estilista, que também fez vestidos para a primeira-dama Marisa Letícia. "Nunca cobrei nada pelo trabalho, foi um presente."
"Políticos são exigentes, gostam de roupas duráveis e se preocupam mais com o conforto", descreve Ivan, que deixou de frequentar Brasília para se dedicar mais à moda. "Aquele trabalho todo estava atrasando meu desenvolvimento no prêt-à-porter", justifica o estilista, que é casado e tem dois filhos.
Ele continua, porém, atendendo à elite política e econômica do Espírito Santo, em sua loja em Vitória, onde também faz roupas sob medida. "Esta função ocupa 60% da minha mente", calcula. O restante do espaço mental é preenchido com a tarefa que ele prefere: criar as coleções que exibe no Fashion Rio desde 2006.

Linguagem jovem
Para Ivan, os jovens receiam usar alfaiataria por medo de parecerem velhos ou muito chiques. "É um problema cultural. Eu canso de atender rapazes que estão usando terno pela primeira vez para se casarem."
Na sua opinião, é possível combinar a alfaiataria com uma linguagem mais jovem. "É o que têm feito grifes como Dior e Lanvin. Fora do país, já existe uma nova geração mais receptiva à alfaiataria e que a combina com outras referências de moda. Mas aqui ainda predomina o jeans e a camiseta cortada no facão." "Cortada no facão" é como ele define a roupa feita sem nenhum apuro. "Não luto contra o jeans e a malharia, que são grandes aliados. O que proponho é que os homens sejam mais exigentes."
As últimas coleções de Ivan Aguilar exemplificam este raciocínio. Escudado por uma alfaiataria de primeira, ele aposta em inovações sutis e calculadas, equilibrando como poucos a tradição e a novidade. É um jeito de não assustar em demasia os consumidores masculinos e tentar convencê-los de que vale arriscar em outros territórios da moda. "No fundo, todos sabem como faz diferença vestir uma roupa criativa e bem cortada", diz.


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