São Paulo, sexta-feira, 06 de fevereiro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA

Berlinale abre seus olhos para produção da África

Júri do festival alemão defende mudança do eixo geopolítico do cinema comercial

Cineasta Wayne Wang sugere enviou de câmeras portáteis a países africanos para estimular a realização de mais filmes na região

SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A BERLIM

Diante da lista dos 18 competidores ao Urso de Ouro, a presidente do júri do 59º Festival de Berlim, Tilda Swinton, teve uma reação interessante: "Que bom encontrar muitos nomes [de cineastas] dos quais nunca ouvi falar. Há filmes do Irã ["About Elly", de Asghar Farhadi] e do Peru ["La Teta Asustada", de Claudia Llosa]".
O deslocamento do eixo -geopolítico e do cinema "mainstream"- foi a tônica do encontro do júri da competição oficial do Festival de Berlim com a imprensa, ontem pela manhã, no primeiro dia do evento, um dos principais do cinema mundial.
Mais de um dos jurados fez a defesa de que as atenções se voltem para a África, onde "não sabemos como as pessoas vivem e como elas estão morrendo", segundo o escritor sueco Henning Mankell, que viveu durante longo tempo no continente africano.
Mas foi do diretor Gaston Kaboré, de Burkina Fasso, a intervenção mais contundente a esse respeito: "O cinema não é um luxo para a África. Mesmo que custe caro fazer um filme, isso é extremamente importante. Há gente que morre todos os dias no mar, tentando ir para a Europa. Talvez o cinema seja um modo de dizer a eles que não é uma desgraça ter nascido na África".
O cineasta chinês Wayne Wang, "feliz por essa conversa estar girando em torno da África e da globalização", disse que "a questão ainda é como tornar [o cinema] mais acessível" e defendeu os filmes de baixo orçamento e a difusão por canais como o site YouTube.

Câmeras portáteis
Wang contou que um amigo seu fez "um ótimo filme com um tipo novo de câmera, a flip câmera, que custa menos de US$ 100". Para ele, "não há mais desculpas" que impeçam as pessoas de "contar sua própria história". Wang sugeriu que "sejam compradas quantidades dessas câmeras e enviadas à África para que as pessoas lá possam falar as coisas do seu ponto de vista".
A sugestão foi feita depois que Mankell disse "culpar fortemente a grande imprensa do ocidente" pelo desconhecimento do mundo em relação ao que ocorre na África. "Já gastaram bilhões para solucionar a crise financeira. E quanto aos US$ 2 bilhões que seriam necessários para resolver o problema da fome na África? Ninguém faz nada, porque não é lucrativo", afirmou.
Tilda Swinton classificou a preocupação geral com a crise financeira como uma espécie de "hipnose" e defendeu que não se deixe de ter em conta outras crises em curso, "como a [os ataques israelenses à faixa] de Gaza".
Ao citar o papel do festival na revelação de novos talentos, a atriz britânica disse que é inócuo "descobrirmos a cada ano novos grandes filmes e cineastas dos quais ninguém mais ouve falar", se os distribuidores de filmes não fizerem seu papel de "alargar o gosto do público frequentador de cinema", exibindo essa produção.
Além dos já convidados citados, integram o júri do Festival de Berlim a ecoativista gastronômica Alice Waters (EUA), os diretores Christoph Schlingensief (Alemanha) e Isabel Coixet (Espanha) e a atriz Hannah Herzsprung.


Texto Anterior: Remédio contra a crise: Ricardo Almeida acredita nas cores
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.