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ROMANCE/"OS DESENCANTADOS"
Escrita em 1950, obra de Budd Schulberg narra trajetória do grande autor da era do jazz
Ficção recria glória e declínio de Scott Fitzgerald
JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA
Tornado célebre com o Oscar de 1954 pelo roteiro de
"Sindicato de Ladrões", Budd
Schulberg merecia também ser
lembrado por sua obra ficcional,
da qual "Os Desencantados" é a
marca na prateleira mais alta da
estante, e uma marca indelével.
Dono de uma prosa estupenda,
herdeira direta do melhor realismo do século 19, Schulberg narra
neste romance de 1950 a ascensão
e queda de um envelhecido e depauperado Scott Fitzgerald, vitimado por seu próprio mito e a
serviço de Hollywood.
Em seus últimos dias, o grande
escritor da era do jazz (rebatizado
no livro como Manley Halliday) é
contratado por um estúdio de cinema para escrever o roteiro de
mediana comédia universitária.
Recém-egresso da Universidade
de Dartmouth, o jovem roteirista
(e alter ego de Schulberg) Shep
Stearns entra no trabalho com
dupla função: escrever e servir de
babá para o autor decadente.
Alcoólatra e diabético, Halliday/Fitzgerald é retratado como
um dipsomaníaco com grande dificuldade de aceitar a árdua realidade da ressaca deixada pelo
crack de 29 e pelos bailes formidáveis da década de 20, período áureo da "geração perdida", à qual
pertenceram Hemingway e tantos
outros escritores americanos, cujas sensibilidades foram forjadas
pela Primeira Guerra e pelo período de celebração posterior a ela.
Com surpreendente estrutura
narrativa, "Os Desencantados" alterna a nostalgia desses anos fervilhantes passados na Europa
com a triste realidade da sobrevivência dos últimos anos de Fitzgerald, vista pelos olhos ao mesmo
tempo admirados e decepcionados do jovem Shep.
Em permanente embate com a
memória dos dias melhores, Halliday tem diante de si o fantasma
do debacle financeiro motivado
pela gastança boêmia e as dívidas
decorrentes da internação de Zelda (renomeada Jere Halliday). A
prosa poderosamente visualista
de Schulberg (e nisto é impossível
não reconhecer a influência do
próprio Fitzgerald) reconstrói
com beleza o reino dos Hallidays
em Paris e nas praias iluminadas
da costa européia, e sua apaixonada descrição da jovem Jere ("um
carrossel espalhafatoso, rebuscado e frágil, incendiado e reduzido
a cinzas") faz com que não apenas
Scott/Manley se apaixone por ela,
mas também o leitor.
Das mais notórias vítimas dos
desvãos sinistros do binômio arte/vida, em seus derradeiros dias
Fitzgerald/Manley mantinha um
dilema sobre o que fazer com suas
últimas horas: sacrificá-las em
Hollywood em prol da sobrevivência ou se dedicar à finalização
do romance que ressuscitaria suas
glórias passadas? Preso da dúvida,
resta-lhe apenas a pergunta que
ecoa: "Jere, Jere, o que fizemos conosco? Não podemos voltar para
o sonho e não podemos ir para
nenhum outro lugar".
Joca Reiners Terron é escritor, autor de
"Hotel Hell" (Livros do Mal), entre outros
Os Desencantados
Autor: Budd Schulberg
Tradução: Alexandre Barbosa de Souza,
Alípio Correia de Franca Neto e Rodrigo
Lacerda
Editora: Cosacnaify
Quanto: R$ 59,90 (432 págs.)
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