São Paulo, domingo, 06 de maio de 2007

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BIA ABRAMO

Desespero das donas-de-casa tem solução


Como fazer a transposição de uma série que é baseada na cultura de subúrbio?

SÓ ESTRÉIA em agosto, mas foi a notícia da semana na área de TV: a Rede TV! apresentou o elenco de "Donas de Casa Desesperadas" e divulgou números oficiais do investimento que vai fazer para a produção do seriado (US$ 5 milhões, cerca de R$ 10 milhões). O investimento é alto, o título é prestigioso e, no entanto, já tem cara de fiasco.
Como fazer a transposição de uma série que é baseada na cultura de subúrbio e no fato de que as personagens que são, simultaneamente, donas-de-casa à americana e mulheres modernas, liberadas? Por donas-de-casa à americana, entenda-se: trata-se de uma organização doméstica na qual estão total ou parcialmente ausentes as empregadas domésticas.
Parece um detalhe, mas não é. A piada do seriado é justamente esta, a de levantar o tapete de um modelo de domesticidade e destino feminino que, em linhas essenciais, tenta preservar uma divisão de trabalho, responsabilidades e universos tal como foi estabelecida lá nos anos 50.
Sim, aqui há donas-de-casa, mas elas são mesmo as donas das casas, administradoras do trabalho doméstico exercido por outras mulheres, e não as "esposas da casa".
Apenas um exemplo: a personagem de Felicity Huffman, Lynette, é uma executiva de sucesso, que opta por cuidar dos filhos na primeira gravidez e se vê com quatro filhos pestes. Sem uma babá sequer, nem ao menos uma faxineira.
Ora, é só andar pelos parques e shoppings nos finais de semana em qualquer grande cidade brasileira para se espantar com a quantidade de moças vestidas de branco, carregando ou entretendo filhos únicos de casais perfeitamente saudáveis e aptos.
Se há algum mérito nas séries norte-americanas, ele está justamente na enorme capacidade de se representar, de maneira razoavelmente verossímil.
Aqui, a recusa em se enxergar é inacreditável.  

Nesse sentido, "Paraíso Tropical" está num fio de navalha. Se, por um lado, a representação do mundo corporativo e dos tipos à margem do dinheiro e do poder são excelentes, as relações amorosas são por demais presas aos modelos românticos. O problema de Paula e Daniel não é de uma eventual falta de química entre Fábio Assunção e Alessandra Negrini, mas da dificuldade de engolir a idéia de o desencontro amoroso ser fruto das circunstâncias, dos equívocos, do "destino", em suma.

biaabramo.tv@uol.com.br


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