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FOTOGRAFIA
Mexicano, que participou do Fotoarte, em Brasília, diz que com digitalização credibilidade está no profissional
"Nenhuma imagem é inocente", diz Meyer
EDER CHIODETTO
EDITOR DE FOTOGRAFIA
"Toda fotografia é política. Não
acredito em fotografias inocentes." Com afirmações assim o fotógrafo mexicano Pedro Meyer,
69, causou polêmica ao participar,
na semana passada, de um ciclo
de palestras durante o Fotoarte
2004, que é realizado em Brasília.
Durante a projeção de seus trabalhos, Meyer mostrou imagens
obtidas através de fotomontagens
que juntam elementos de duas ou
até cinco fotos. Questionado sobre a integridade de tais fotografias, Meyer rebateu: "Ao pedir para as pessoas posarem, o fotógrafo
está interferindo no mundo visível assim como eu nessas imagens. Por que o espanto?".
Em entrevista exclusiva à Folha,
ele falou sobre o impacto das imagens obtidas por telefone celular,
as fotografias de tortura de Abu
Ghraib, a expansão dos fotologs e
o futuro da profissão dos repórteres-fotográficos. Leia a seguir os
principais trechos.
Folha - Por quanto tempo ainda
existirão filmes em negativo?
Pedro Meyer - Creio que o negativo sobrevive por mais quatro ou
cinco anos. Sobretudo porque as
fábricas estão ficando deficitárias.
No México várias já fecharam. Para 2005 o número de câmeras acopladas a um telefone será sete vezes maior que a venda total de câmeras digitais e analógicas juntas.
Folha - Teremos um exército de
fotógrafos tirando fotos o tempo
todo...
Meyer - Sim, calcula-se que em
2005 serão tiradas 65 bilhões de
fotografias com telefone celular.
Folha - É a morte do repórter-fotográfico?
Meyer - Não, é a transformação
da profissão. Até agora acreditava-se que a fotografia tinha a validade de um documento que se
autocomprovava. Uma lógica terrível. Como algo pode ser testemunha de si mesmo? Um texto
sempre deixa margem para a dúvida, mas a fotografia carrega
com ela a aura da veracidade. É
um erro. Você pode escrever verdades ou mentiras, não é porque
está escrito que é verdade. Fotógrafos temem a foto digital por
acharem que a fotografia vá perder a credibilidade pela facilidade
em alterar seus elementos no
computador. Acho que os fotógrafos deveriam estar contentíssimos. Pois, se a fotografia perde a
credibilidade, quem a deverá ter é
o fotógrafo, como ocorre com o
repórter de texto. Melhor a credibilidade estar com a pessoa, não
com seu objeto. Com a digital a
fotografia passa a ser tão instável,
tão manipulável, quanto o texto.
Folha - Então qual é o caminho do
repórter-fotográfico agora?
Meyer - Os repórteres-fotográficos devem investir em histórias
que de fato valham a pena. Acabou a geração de disparadores de
botão. Só irão sobreviver fotógrafos que tiverem histórias para
contar. Com a facilidade operacional das câmeras portáteis qualquer um pode fazer as fotos corriqueiras, além do que será infrutífero enviar um fotógrafo ao local
de um acidente, por exemplo,
pois, até ele chegar lá, muitos já terão feito a melhor foto antes.
Folha - Como você vê o fenômeno
das imagens de tortura feitas em
Abu Ghraib?
Meyer - Essas imagens inauguram uma nova fase no fotojornalismo. Pelo fato de todas as imagens serem digitais e obtidas por
amadores, tão logo elas surgiram
a Casa Branca quis desacreditá-las dizendo que eram manipuladas. Mas em seguida surgiram várias outras imagens. A referência
cruzada desmontou esse argumento. Não era possível que tantas imagens de diferentes fontes
fossem manipuladas. É a primeira
vez na história que uma fotografia
apenas não é suficiente para provar um fato. É necessário a referência cruzada com outras fontes
de informação para lhe dar veracidade. Essas fotos de Abu Ghraib
são correlatas às imagens do Vietnã. E as câmeras digitais estão para Bush assim como os gravadores estiveram para Nixon no caso
Watergate.
Folha - E o fenômeno dos fotologs?
Meyer - Esses sites são uma forma de furar o cerco antidemocrático de acesso à informação, como
o imposto pelos EUA na Guerra
do Iraque, por exemplo. À medida que a CNN se transformou numa agência de publicidade do governo americano, coube aos fotologs revelar ao mundo o que de fato ocorre nos bastidores da guerra. A censura se baseia no controle do sistema de difusão das notícias, mas, quando o meio se torna
tão extenso como a internet, não
há como controlar.
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