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CRÍTICA
Caetano está virando o FHC da MPB
SÉRGIO DÁVILA
Editor da Ilustrada
A se tomar por seu show atual,
em cartaz no Via Funchal de São
Paulo, Caetano Veloso está virando o Fernando Henrique Cardoso
da MPB. Vive na arte o mesmo
impasse que sua geração experimenta na política: o que fazer, para onde ir?
Embora haja diferença de idade,
ambos se agarram a eventos que
fizeram sentido nos anos 60 e 70
(a tropicália, no caso de Caetano;
a teoria da dependência, no caso
de FHC; os dois agora redescobertos pelos gringos, o que dá
alento extra à dupla).
Forçando um pouco mais a
mão, é possível enxergar na estrutura e nos integrantes do show em
questão traços nítidos dos dois
mandatos de FHC. Se não, vejamos:
* o show começa com Caetano
Veloso no centro; à esquerda de
quem olha (mas à sua direita), a
percussão, só com componentes
negros, fazendo timbalada (é o
povão); à direita de quem olha
(mas à sua esquerda), os sopros e
as cordas, de maioria branca, fazendo jazz de gringos (é a elite);
* os arranjos e a direção são do
onipotente Jaques Morelenbaum,
para muitos uma associação que
"embarrocou" demais a música
de Caetano (é o ACM);
* o único hit é "Sozinho", do compositor brega Peninha, que puxou
as vendas do último CD para a casa do milhão, fato inédito na carreira de Caetano Veloso (é o Plano Real, o flerte com as classes C e
D, o acesso ao consumo);
* no meio da apresentação, CV
diz que é bom poder voltar a falar
português de novo, depois de tanto tempo falando inglês e francês
no giro internacional (é FHC em
sua última turnê européia, encantando as platéias com seu poliglotismo academicista);
* a certa altura, CV canta a chicana "Lamento Borincano" (é o
flerte com o Mercosul);
* os solos de percussão e os passos
de samba acontecem sempre
num clima "macumba para turista" (é a Cimeira 99);
* por fim, o bis com "Sozinho": é a
reeleição.
A única diferença é a leitura de
trechos de "Verdade Tropical", o
livro de Caetano: enquanto este
implora para que o público não
esqueça o que ele escreveu, FHC
parece ir no rumo contrário.
Como já disse alguém, a obra
de Caetano Veloso é muito maior
que a mesquinhez de seus críticos
-e é verdade. Mas são estes mesmos críticos que sentem saudade
de todo aquele Caetano Veloso
que eles ainda não viram.
Avaliação:
Show: Caetano Veloso
Quando: hoje e amanhã, 22h; dom.
20h30
Onde: Via Funchal (r. Funchal, 65, Vila
Olímpia, São Paulo, tel. 0/ xx/11/866-2300)
Quanto: de R$ 30 a R$ 100
Patrocinador: Nokia
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