São Paulo, quinta-feira, 06 de setembro de 2001

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Folha reúne o diretor e o maior escritor albanês, autor da obra em que se baseia o filme

Salles e Kadaré constroem a vingança de "Abril Despedaçado"

Longa de Walter Salles, inspirado em romance de Ismail Kadaré, estréia hoje na disputa em Veneza

ALCINO LEITE NETO
DE PARIS

O Festival de Cinema de Veneza exibe hoje um dos candidatos mais fortes ao seu prêmio máximo, o Leão de Ouro. Trata-se do filme "Abril Despedaçado", dirigido por Walter Salles.
O longa-metragem é inspirado no romance homônimo do escritor albanês Ismail Kadaré, uma história trágica envolvendo códigos de vingança e crimes de sangue entre duas famílias.
Na versão de Salles, a vendeta se passa no interior da Bahia, nos anos 10. Um conflito ancestral pela posse de terra culmina no drama de Tonho (Rodrigo Santoro), obrigado pela tradição a vingar a morte de seu irmão mais velho.
Kadaré é considerado hoje um dos principais escritores europeus. Nos últimos anos, seu nome tem aparecido cada vez mais frequentemente entre os candidatos ao Prêmio Nobel de Literatura.
Sua obra ficcional é toda ela um esforço de compreensão e universalização da história e do presente albaneses. É também um ensaísta notável. No Brasil, seus livros têm sido lançados pela Companhia das Letras -entre eles, "Abril Despedaçado".
Por sugestão da Folha, Kadaré, 65, e Walter Salles, 45, se encontraram em Paris para discutir sobre cinema, literatura e as distâncias e proximidades entre o mundo albanês e o brasileiro.
O escritor vive na capital francesa desde 1990. O diretor brasileiro se encontrava em Paris para finalizar seu filme a tempo de competir na mostra italiana.
A conversa ocorreu no apartamento de Kadaré, antes que o escritor pudesse assistir ao filme, o que ele fez nesta semana, considerando-o "magnífico" -a reação do escritor, já em Veneza, está à pág. E-3. Seu entusiasmo com a terceira versão cinematográfica do romance o levou a embarcar para o festival, onde participa da première oficial e do debate sobre "Abril Despedaçado".

Folha - É a terceira vez que o seu romance, de 1978, ganha uma versão para o cinema.
Ismail Kadaré -
A relação do cinema com a literatura é muito difícil. Eles funcionam diferentemente. Na literatura, cada um lerá o seu "Hamlet", mas, no cinema, o filme existe de maneira objetiva, fora de você mesmo, e é impossível que cada um veja um "Hamlet" diferente. Assim, quando dou algo ao cinema, eu renuncio a julgar. Dei o livro para que pudesse renascer em outra arte, em outro espírito e país.

Walter Salles - Na condição de realizador, o que eu tento fazer é respeitar a força do livro, a impressão que me atingiu num primeiro momento, e retransmiti-la de um ponto de vista cinematográfico. Mas os filmes nunca são tão bons como os livros, sobretudo se os livros são tão bons como "Abril Despedaçado".


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