São Paulo, domingo, 06 de novembro de 2005

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TV PAGA

"As Bruxas de Salém" relembra o puritanismo

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Quando escreveu sua peça, nos anos 50, Arthur Miller pensava na caça às bruxas promovida pelo senador Joseph McCarthy, em que o rádio era veículo privilegiado das acusações movidas contra pessoas suspeitas de comunismo pela Comissão de Atividades Anti-Americanas do Senado.
A alegoria era bem evidente, talvez necessária, o que não se pode dizer do filme de 1996 de Nicholas Hytner, "As Bruxas de Salém" (TC Emotion, 3h35). Ali, um grupo de mulheres pegas em flagrante num ritual são acusadas de feitiçaria. Estamos no século 17, na América puritana, e a primeira providência da líder das acusadas é empurrar a culpa para cima de Daniel Day Lewis e sua mulher.
O clima criado pela situação exige que esse culpado exista e a culpa se estabeleça. O fato de ser verdadeira ou não é o que menos importa.
A peça de Miller talvez tenha contribuído para dar fim ao festival de evidências nem sempre muito evidentes que foi o macarthismo, em que, na maior parte das vezes, pequenos pecados tornavam-se enormes delitos (exemplo: ter sido comunista nos anos 30 comprometeria alguém nos anos 50, mesmo se tivesse virado anticomunista).
Como sempre nesses casos, o alvo de McCarthy não era tanto o comunismo quanto os seguidores de Franklin Roosevelt. Era o "new deal" que se procurava golpear.
A caça às bruxas acabou como uma bolha que estoura; McCarthy sumiu do mapa. Diz Marshall MacLuhan que foi efeito da TV, um meio onde atitudes inquisitoriais são mal recebidas pelos espectadores. Pode ser. Talvez um mérito deste filme com não tantos méritos assim seja lembrar a nós, brasileiros e muito mais maniqueístas do que pensamos ser, que certo e errado, bem e mal são muito mais relativos do que gostaríamos que fossem.

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