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"A Voz do Samba" compila obra do cantor
da Reportagem Local
Aos 84 anos, o sambista carioca
Jamelão nem quer ouvir falar na
compilação "A Voz do Samba",
resumo da gravadora Continental,
em três CDs, de um período de 33
anos de sua carreira.
"Não sei se gostei ou não gostei,
não quero falar nada sobre esse
troço aí. Eu não estou nessa, já estou em outra gravadora, a RGE. O
que tem nessa caixa foi feito há
muitos anos, quando eles não fizeram nada por mim", resmunga à
Folha, argumentando que tem outro compromisso e não quer falar.
É o retrato de Jamelão, artista
que, mais reconhecido pelo senso
comum como puxador de escola
de samba -denominação que ele
abomina- que como cantor,
sempre prescindiu de rapapés que
garantam sua permanência no
chão de estrelas da MPB.
Jamelão iniciou-se na música aos
15 anos, como integrante da bateria da Mangueira. Só em 1949, aos
36, foi estrear em disco. Pois "A
Voz do Samba" vem entregar a
público o cantor, não o puxador
ou a figura folclórica que todo ano
avisa a qualquer desavisado que a
Mangueira vai entrar em campo.
A caixa abrange -com muitas
lacunas- a obra de Jamelão desde
sua estréia na Continental, em
1954. Os três CDs são dispostos de
forma mais ou menos conceitual.
No primeiro, vem o rótulo execrado pelo artista, o de puxador
-é uma compilação de sambas-enredo gravados entre 74 e 76.
Contam-se aí clássicos do samba
de avenida, como "Apoteose ao
Samba", "Macunaíma" ("Vou-
me embora, vou-me embora/Eu
aqui volto mais não/Vou morar no
infinito/E virar constelação") e
"No Reino da Mãe de Ouro", de
Tolito e Rubens da Mangueira.
A voz de Jamelão -parodiando
sua personalidade- adequa-se
apenas em parte ao propósito não
raro ufanista dos sambas-enredo.
Ríspida, oscila entre o respeito às
convenções de avenida e a ironia
embalada num cantar intuitivo,
aparentemente displicente.
Fenômeno parecido pode se perceber no CD 2, todo dedicado à
obra daquele de quem Jamelão é
considerado o maior intérprete: o
gaúcho Lupicinio Rodrigues.
Ambos se descobriram nos 60
-a bossa nova já havia eclodido.
Seu modo de cantar Lupicinio oscila, novamente, entre disciplinado e sarcástico, entre os pulmões
da tradição e a maciez da bossa.
O terceiro CD, mais diversificado, demonstra que mesmo antes
da bossa ele já era um cantor de
meio-termo. Em peças cruciais
dos anos 50, já evidenciava certo
descolamento às normas de canto
impostado dos mestres antigos.
Talvez por nunca se filiar a qualquer dos partidos, atravessou décadas de independência, a ponto
de esnobar, desinteressado, um
memorial de sua obra. O memorial
está aí, seja como for.
(PAS)
Caixa: A Voz do Samba
Artista: Jamelão
Lançamento: Continental
Quanto: R$ 55, em média
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