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FERNANDO BONASSI
Filha
As aventuras mais gloriosas que vivemos foram "imediatizadas" pelos sites de fofocas
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ANTES QUE chegue esse domingo alardeado pelos anúncios,
quando os presentes mais lindos do supermercado podem nos fazer esquecer do futuro lúgubre que
eu tenho te legado, queria me desculpar pela herança desses tempos...
Sabíamos muito bem, e há muitas
décadas, o que estava velho para
mudar. Jovens, mudamos as pequenas coisas que nos faziam tropeçar
para que pudéssemos continuar,
mas, crescendo, nos amedrontamos
da grandeza que era necessário possuir, e agora mal sabemos onde não
podemos ir parar com a nossa paralisia.
Assim, dia-a-dia, preferimos nos
especializar e estudar maneiras de
"ficar"...
E então paramos para nos confortar até quando a urgência de nossos
movimentos seria o único alento para colaborar com sua sobrevivência!
Transformamos em ciência a conveniência do mal-estar...
Era para chegar e transtornar,
mas começamos a negociar para
apascentar e fomos reduzidos a este
pasto que mal pavimentamos para
pousar...
Chegamos, nuns momentos tempestuosos, a achar que a nossa novidade ia acontecer, mas a verdade é
que a degeneração preguiçosa de
nossa geração preferiu acomodar,
supondo que era para o destino prover o que nós devíamos tomar nas
mãos e realizar, pagar o preço de investir, de arriscar perder para poder
ganhar, ter posição para transformar em realidade a melhor qualidade dos nossos sonhos civilizados.
Está desorganizado, injusto e tolo
como esperar para repartir o bolo...
A amargura dessa barbaridade está progredindo às vistas de nossas
autoridades delegadas, sendo filmadas por câmeras escondidas pelas
polícias, já que os jornalistas acomodados às coletivas e telefones se perderam de procurar saber para informar e esclarecer.
É obscuro mesmo. Os historiadores vivem repetindo essas coisas para nos alertar, mas a gente nem
aprendeu a lição do século 20, quanto mais no que esse tal de "novo milênio" -que tememos- vai te dar...
Por minha conta, causa, ou culpa,
minha querida, a minha dor mais ardida é a percepção tardia de que vocês vão se dar mal...
Quem sabe pior que nós!
Afinal nossos exemplos dão dó, ou
são simplesmente tão ruins, que a lição inteligente que resta para aprender é a decoração daquelas biografias imortais dos imorais de nossas
desventuras...
Quanto à nossa contribuição, as
aventuras mais gloriosas que vivemos foram "imediatizadas" pelos sites de fofocas das revistas eletrônicas, cuja contribuição à burrice da
população só seria suplantada pelas
idéias fracassadas, canônicas e conservadoras dos roteiristas ficcionistas e escribas de moral da televisão
comercial.
Nossos sindicalistas se tornaram
"empreguistas", os subempregados
prensados nesses salários ainda
acreditam nas "oportunidades" desses capitalistas subsidiados, os capitalistas mais educados lavam as
mãos de suas "predações privatistas" com pregações assistencialistas;
os presidentes eleitos (acadêmicos
ou operários) têm vergonha de seus
passados democrático-socialistas,
fazendo as mesmas alianças com os
latifundiários escravistas e, para corolário desse bando de reacionários,
os velhos deputados comunistas se
escoram nas imunidades dos fascistas, em nome da lei e sem a menor
vergonha de desdizerem o que escreveram ou leram nas teses, nos
manuais jurídicos ou juraram nas fichas honrosas e mentirosas dos nossos partidos desiludidos.
Nem mesmo os juízes deixam
mais felizes os filhos dos desgraçados, que já preferem as oportunidades dos traficantes aos exemplos
edificantes dos senadores que se
penduram por pentelhos aos seus
cargos.
Preferimos grudar para não cair...
A queda seria longa, dura e insignificante.
Nada mais fizemos do que deixar
passar, já que aprendemos a nos calar, não reclamar, nem questionar,
como se gritar fosse horroroso, reclamar, coisa de louco, e questionar,
desnecessário para construir...
Acontece que, ao contrário dos
nossos pais -e talvez pela primeira
vez na história deste país também-,
juramos nas praças emocionadas
que não íamos nos acomodar...
Bem, por muito menos do que isso
fizemos o serviço que era mais fácil,
tranqüilo e mixo -o de perseverar
no mesmo lugar-, quando devíamos ter nos dado ao trabalho de
criar, investir e dividir para prosperar.
Devíamos estar cansados do que
não fizemos.
Em nossa casa este será um dia para lamentar.
Com amor incondicional;
Teu pai.
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