São Paulo, sábado, 07 de agosto de 2010

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CRÍTICA CONTOS

Coletânea mostra princípio violento de Vargas Llosa

NELSON DE OLIVEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nas décadas de 1960 e 1970 do século passado, o boom latino-americano colocou no mapa da Europa a literatura da América subdesenvolvida. De repente, passamos a existir para os inventores da literatura ocidental. Ao lado do argentino Julio Cortázar, do mexicano Carlos Fuentes e do colombiano Gabriel García Márquez, o peruano Mario Vargas Llosa foi um dos promotores e um dos mais promovidos pelo boom.
Oito anos separam a coletânea de contos "Os Chefes" (1959) da narrativa "Os Filhotes" (1967), reunidas aqui em um só volume. Entre a primeira e a segunda, estão os romances premiados "A Cidade e os Cachorros" (1963) e "A Casa Verde" (1966). Tudo isso forma o início bem-sucedido de um escritor cujas principais obras ainda estavam por vir: "Conversa na Catedral" (1969), "Pantaleão e as Visitadoras" (1973), "Tia Júlia e o Escrevinhador" (1977), entre outras.
William Faulkner e Carlos Fuentes são citados, quando se fala nos autores que influenciaram o jovem Llosa. No livro que acaba de chegar às livrarias brasileiras, essa influência está bastante evidente. Mas isso não atrapalha em nada a diversão.

TESTOSTERONA
"Os Chefes" reúne seis conflitos. São cinco rounds de violência pura e o último, de afetuosa perversidade. Desse conjunto, as ficções urbanas mostram rapazes desafiando-se, disputando um território ou uma garota.
Ou desafiando coletivamente as normas rígidas de uma ditadura escolar, representação menor das várias ditaduras da América Latina. Longe da metrópole, as narrativas rurais também falam de acertos de conta. Onipresente, apenas a morte. São seis histórias de enredo simples, contadas com graça e elegância. Respeitam a forma tradicional do gênero, não esquecendo a bem-vinda surpresa no último parágrafo. Em "O Avô", essa surpresa é quase inverossímil, mas sua estranheza provoca um lampejo de humor que acende o conto.
"Os Filhotes" mostra a passagem da infância para a maturidade na Lima dos anos 1950. O enredo também é simples, em linha reta.
A amizade de um grupo de garotos é posta à prova depois que um deles, Cuéllar, é atacado por um cão dinamarquês. O ataque ocorre no colégio marista e -ironia- o nome do cão é Judas. A partir desse incidente, o apelido do menino passa a ser Piroquinha. Um apelido-destino.
Mas essa narrativa, se comparada com as anteriores, é formalmente muito mais complexa. Uma interessante movimentação cubista surge do discurso indireto livre, da pontuação excêntrica e das súbitas mudanças da primeira para a terceira pessoa do singular.


NELSON DE OLIVEIRA é autor de "Poeira: Demônios e Maldições" (Língua Geral)


OS CHEFES, OS FILHOTES

AUTOR Mario Vargas Llosa
TRADUÇÃO Paulina Wacht e Ari Roitman
EDITORA Alfaguara
QUANTO R$ 29,90 (136 págs.)
AVALIAÇÃO bom




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