São Paulo, quinta-feira, 07 de setembro de 2000

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"Isso aqui é um negócio", diz Edemar Cid Ferreira

DA REPORTAGEM LOCAL

Edemar Cid Ferreira, presidente da Associação Brasil 500 Anos Artes Visuais, ordenou a montagem de cenografias nos 13 módulos do Redescobrimento. "Foi uma imposição e acho que fiz certo. A maioria dos 40 curadores era contra. Muita gente não gosta, mas o povo gosta."
Galeristas de São Paulo ouvidos pela Folha criticaram o uso de cenários na exposição, afirmando que o suporte decorativo rouba o foco da arte.
"Deixa polemizar", diz Cid Ferreira. "Não tenho comprometimento nem com universidades nem com museus. O divertimento, o lazer, é parte do conjunto da educação. Eu tenho de buscar o meu cliente, que é aquele que não tem formação."
Na última sexta, antes de viajar para EUA e Europa, Cid Ferreira falou à Folha. (FCY e FC)

Folha - As cenografias são criticadas. O que o sr. diz sobre isso?
Edemar Cid Ferreira
- Fiz três pesquisas com o Datafolha e os índices de aprovação são altos. É isso que faz com que as pessoas venham. É o boca a boca: "Vai lá, tem uns loucos lá. Tem um troço cheio de flores, um outro todo escuro". Você tem de mostrar um pouco de diversão com a cultura.

Folha - A Mostra do Redescobrimento é entretenimento?
Cid Ferreira
- Não. É uma atividade cultural em que o entretenimento é parte, para atingir o objetivo. Se aqui fosse um museu ou uma universidade, eu não poderia fazer isso. Mas não sou nem um nem outro. Achei que tinha de ter a cenografia porque estou fazendo uma grande festividade.

Folha - Qual o gasto da mostra?
Cid Ferreira
- Genericamente, posso dizer que gastamos R$ 45 milhões, mas dou os detalhes depois do encerramento. Só com o Guggenheim, já gastei quase US$ 2 milhões. Agora, em setembro, vamos gastar mais US$ 800 mil. Com o British Museum, foram outros US$ 500 mil. Vamos fazer um balanço porque temos um gasto aqui que não é dessa exposição. São gastos com as coisas que vamos fazer em 2001.

Folha - Uma das críticas é que museus estrangeiros estão fazendo a curadoria de uma mostra sobre o Brasil, e o sr. está pagando.
Cid Ferreira
- Não é verdade. Decidimos fazer a itinerância internacional quando o governo abortou a nacional. Aí houve aquele negócio todo, entrou o (ex-ministro Rafael) Greca... Nós fomos buscar os museus para nos receber e pedir espaço para 2001. Achavam um absurdo porque trabalham com uma programação de anos. Perguntavam quem bancaria a mostra. Dei as garantias e já comecei a pagar.

Folha - O sr. já arrumou os patrocinadores?
Cid Ferreira
- Um monte, porque vamos fazer uma exposição para mudar a imagem do Brasil. Nova York é o centro financeiro do mundo. Então, quanto mais o Brasil for reconhecido, mais poderá fazer negócio. Com o British Museum é a mesma coisa.

Folha - Fazer exposições também é um negócio?
Cid Ferreira
- Isso aqui é um negócio. Eu aposto quando sei que vou pegar o patrocinador.

Folha - O governo iria repassar à associação R$ 8,5 milhões...
Cid Ferreira
- Recebemos até agora R$ 2,6 milhões do Ministério da Cultura. Havia uma conversa, mas nada foi formalizado. Mas isso não é mais importante.

Folha - Qual é a maior contribuição da mostra?
Cid Ferreira
- É mudar o conceito de origem. O Brasil não é respeitado porque o cara lê o brasileiro como um bicho. Aqui, não. Acho que a arqueologia é uma das coisas mais importantes que têm de acontecer ao Brasil.
Você tem o período de 1500 a 2000 que conhecemos. Investimos na arqueologia e nas artes indígenas para colocar o homem de 1500 em igualdade de condições com o índio pré-Cabral. Tudo para dizer que isso é cultura.

Folha - A curadoria teve interferência sua?
Cid Ferreira
- É interferência de toda a curadoria, porque quem conduz uma exposição é a própria mostra. Começamos de 1500 para cá. Mas fomos percebendo que as artes plumárias eram importantes, a arte rupestre também. Essas coisas nascem assim.

Folha - De qual módulo o sr. mais gosta?
Cid Ferreira
- Gosto muito de Arqueologia e Arte Indígena. Eu me joguei muito nisso. Fiz o filme, fiz o Cine Caverna. Adoro o Barroco, o Olhar Distante.

Folha - O sr. gosta de arte contemporânea?
Cid Ferreira
- Muito pouco. Primeiro porque não entendo metade das obras que eu vejo. Há uma arte contemporânea com que eu me identifico. E tudo na vida é uma questão de destilação.

Folha - Como a associação vai funcionar, a partir de agora?
Cid Ferreira
- Temos uma atividade política fundamental, que é mudar a imagem do Brasil. Como você faz isso? Mostrando o outro lado do Brasil. Nenhum país da América teve uma cultura negra como nós, uma cultura indígena como nós, um período importante de um império.
Por isso a associação não tem mais tempo para terminar. Vamos fazer um evento importante no Guggenheim. Vamos mostrar o Brasil por cinco meses. Nunca aconteceu isso na história do museu. Queremos que líderes culturais, sociais, da mídia, do financeiro, do industrial identifiquem um país que não conheciam.

Folha - As polêmicas com a Bienal atrapalharam a mostra?
Cid Ferreira
- Atrapalharam a mim e ao Pedro Paulo (Sena Madureira, vice-presidente da associação), porque a gente perdeu tempo. Isso perturba, até porque não era nem verdade o que algumas pessoas diziam. Elas se sentiram prejudicadas, atrapalharam a nossa vida, inventaram coisas. Isso aqui é aberto, não há segredo. Tudo tem uma contrapartida do ponto de vista fiscal.


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