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PERSONALIDADE
Artista faz 80 anos hoje, estréia peça "Variações Enigmáticas" e responde a perguntas de colegas do teatro
"Sou só um ator que trabalha", diz Autran
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O decano, o paradigma, o rei.
São muitos os epítetos que surgem para situar Paulo Autran no
teatro brasileiro. "Monstro sagrado, mito, essas coisas todas vêm
da cabeça dos outros. Na minha,
eu não sou nada disso. Sou só um
ator que trabalha", afirma Autran, 80 anos completados hoje,
quando também estréia "Variações Enigmáticas" em São Paulo.
A seguir, oito personalidades do
teatro fazem perguntas a Autran,
a pedido da Folha.
Fernanda Montenegro, 72, atriz -
Vejo você como uma pessoa tão
realizada, tão inteirada da tua própria vida, que gostaria de saber
que pergunta poderia te fazer. Tenho grande admiração por ti.
Paulo Autran - Fernanda, que
bela sinuca você me coloca. Eu sei
lá qual é a pergunta? Você não
tem a menor curiosidade a meu
respeito, então não pergunte nada
mesmo [risos].
Bibi Ferreira, 80, atriz e diretora -
Sempre quis saber como você vê os
diferentes sotaques dentro do nosso teatro, pois por vezes acontece
de termos uma rainha carioca, uma
filha nordestina, um rei de Porto
Alegre e por aí vai. Uma companhia
clássica estável, a exemplo de outros países, poderia lapidar esse
problema? Ou não é um problema?
Seria como afinar orquestra, afinal, é a profissão da palavra.
Autran - Estou plenamente de
acordo com você. Quando nós fizemos "Otelo" (1956) na Cia. Tonia-Celi-Autran, eu até tentei isso.
Estava a par dos últimos resultados de congressos sobre português falado e erudito no Brasil, e
tínhamos efetivamente atores
nordestinos e sulistas. Tentei uniformizar a pronúncia. Numa crônica, o Carlos Drummond [de
Andrade] disse que a riqueza das
pronúncias no Brasil é uma coisa
muito simpática, e que não se deve pensar em uniformizar nada.
Mas acho que, em se tratando de
um espetáculo, de um texto erudito, o ideal é que haja uma uniformidade de prosódia, sim.
Antunes Filho, 71, diretor - Você
trabalhou com todos os diretores
estrangeiros que vieram ao Brasil.
Qual deles considera mais significativo e por quê?
Autran - De todos os diretores,
incluindo aí o [Zbigniew] Ziembinski, o Ruggero [Jacobbi], o
mais significativo é claro que foi
Adolfo Celi, um homem que conseguiu fazer com que fosse possível a convivência naquele elenco
do Teatro Brasileiro de Comédia,
mais de 30 pessoas unidas por um
contrato anual. Ele dirigia o elenco, os outros diretores, dava palpite em tudo. Celi era o cérebro no
período áureo do TBC.
Walmor Chagas, 72, ator - Paulo,
eu o julgo o paradigma do ator brasileiro. Infelizmente, nunca tive a
chance de contracenar com você.
Qual a importância que a vivência
no TBC teve na sua carreira?
Autran - A minha formação de
ator foi no TBC, principalmente
nas mãos de Adolfo Celi. Agora,
eternamente estou me formando
como ator, nunca paro.
Sérgio Viotti, 75, ator, diretor e
dramaturgo - Houve algum momento em que tivesse pensado em
deixar o teatro de lado e seguir outra profissão?
Autran - Não. Nunca houve esse
momento.
Gianfrancesco Guarnieri, 68, ator
e dramaturgo - Gostaria que nos falasse sobre os diferentes momentos de nossa produção teatral, desde a "revolução" dos anos 50 até os
dias de hoje, salientando os períodos que considera mais estimulantes e os mais preocupantes. Poderíamos concluir que "assim vai o
mundo e não vai bem"?
Autran - Os momentos mais
preocupantes foram os do golpe
de 64, quando tudo o que havia de
bom estava proibido. Paradoxalmente, aquela mordaça estimulou muito o seu trabalho, não foi,
Guarnieri? Mas sabemos o mal
que a censura nos fez a todos. O
mundo não vai bem, e a gente tem
que fazer das tripas coração para
despertar um pouco de otimismo
no público. Agora, não me pergunte desde quando o mundo
não vai bem...
José Celso Martinez Corrêa, 64,
ator e diretor - Qual o poder do ator
brasileiro na sociedade atual? O
ator está delegando seu poder aos
políticos, ao mercado? Qual o poder dele na terra em transe? O ator
exerce o poder que tem, ou há uma
crise de soberania?
Autran - Você sabe, Zé Celso,
que eu jamais consegui associar a
palavra poder à minha função
dentro do teatro. Compreendo
que muita gente acha que o teatro
é um trampolim para uma vida
política, para uma atuação política. Acho o teatro político importantíssimo quando o país necessita de uma mudança política, como foi o caso do período violento
e horrível que vivemos na ditadura. A partir do momento que estamos todos vivendo numa democracia, das mais liberais do mundo, é bom que se diga, eu não me
atribuo nenhum poder político.
É claro que, por sermos conhecidos, lidarmos justamente com
os sentimentos, as emoções do
pequeno público que vai ao teatro, a nossa opinião talvez possa
influir um número muito limitado de pessoas. E, se tentarmos influir, de acordo com as idéias de
cada um, tanto melhor.
Mário Bortolotto, 40, ator, diretor e dramaturgo - Vai continuar
lançando no teatro talentos indiscutíveis como a "grande" Adriane
Galisteu?
Autran - Havendo oportunidade, eu precisando de um ator jovem, de uma atriz jovem, espero
lançar os grandes talentos, sim.
Veja fotos da carreira de Paulo Autran
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