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Comida
À moda nordestina
Na zona norte de SP, Mocotó faz sucesso com pratos do sertão; conheça outras casas bem-sucedidas no gênero
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Oitenta lugares não bastam
mais para acomodar os clientes
no almoço de sábado. Tem dia
em que a fila de espera leva
duas horas para se desfazer. E
não se trata de um restaurante
novo, instalado num bairro badalado. Também não é sofisticado nem serve nenhuma novidade gastronômica.
O que leva tanta gente ao Mocotó é o mínimo que se espera
de um bom restaurante, mas
que nem todos oferecem: comida de qualidade, bem-feita e,
ainda por cima, barata.
Dos caldeirões e caçarolas do
seu Zé Almeida, 68, saem porções abundantes de receitas típicas do sertão nordestino: caldo de mocotó, sarapatel, baião-de-dois, carne-de-sol, favada e
um irresistível bode atolado,
cujas carne e mandioca derretem na boca.
Instalado há mais de 30 anos
na Vila Medeiros, bairro da zona norte paulistana sem tradição gastronômica, o Mocotó
começou como uma Casa do
Norte, uma espécie de secos e
molhados onde Zé Almeida e
seus irmãos vendiam de tudo
um pouco: rapadura, farinha de
mandioca, manteiga de garrafa
e até umas "quinquilharias"
(vassoura, peneira, chapéu).
"Eu plantava milho, feijão e
algodão na roça [em Mulungu,
no sertão de Pernambuco].
Dois irmãos vieram para cá, se
deram bem aqui e mandaram
me chamar. Vim, como a gente
diz, com duas camisas, uma calça e um par de sapatos", conta
Zé Almeida, que trabalhou numa fundição, numa fábrica de
laticínios e numa metalúrgica
antes de ter negócio próprio.
"Geralmente, as Casas do
Norte têm um balcãozinho para vender petiscos e cachaça.
Cheguei a vender 22 caldeirões
de caldo de mocotó num dia.
Essa demanda me fez abrir o
restaurante."
Até quatro anos atrás, o Mocotó tinha apenas dez mesas e
era um bocado mais simples. O
ambiente mudou um pouco depois de uma temporada de "seis
meses e oito dias" que Zé Almeida passou no Nordeste.
Quando voltou, o filho, Rodrigo, 26, formado em gastronomia, tinha feito uma reforma
que não agradou muito a Zé Almeida. "Ele tomou um susto e
eu, uma bronca", conta Rodrigo, que hoje toca o restaurante
e impõe seu toque seja por
meio de uma apresentação
mais cuidadosa dos pratos, da
atenção dispensada aos clientes, ou de seu trabalho de pesquisa, como uma viagem em
busca de pingas. Sim, o Mocotó
oferece mais de 340 marcas de
cachaça, fora as garrafas que,
por fazerem parte de uma coleção, só "enfeitam" a prateleira.
Da roça à cozinha
A trajetória de Zé Almeida se
assemelha à de muitos outros
homens que trocaram o sertão
nordestino pela vida em São
Paulo e aqui encontraram espaço no setor de alimentação.
Surgiram casas de decoração
simples, pratos de boa qualidade e preços, em geral, bastante
razoáveis.
Agricultor em Piquet Carneiro, no Ceará, Raimundo Nonato Oliveira, 53, veio para cá "ganhar a vida mais fácil". "É melhor que trabalhar na roça", diz.
Foi garçom em vários restaurantes antes de comprar, há 24
anos, o Rancho Nordestino, na
Bela Vista. "Quando a gente
vem de lá, o ramo mais fácil é
restaurante mesmo, porque
não exige muita experiência."
Aos finais de semana, a casa
enche. É um tal de puxa-mesa-daqui-e-põe-acolá. O carro-chefe é o baião-de-dois com
carne-de-sol que pode, é claro,
ser acompanhado por pingas de
vários Estados. "O nordestino
gosta de tomar uma cachacinha
para abrir o apetite", diz.
Outro exemplo de sucesso da
comida nordestina em São
Paulo é o Galinhada do Bahia. O
que começou como um forró
não demorou para virar restaurante, em 1992. "Domingo era
dia de tomar aquela cervejinha,
reunir os amigos. Eu fazia rabada, cozinhava um frango, e o
pessoal ia almoçar em casa e dizia: "Bahia, tu cozinha demais".
Foi quando decidi montar o
restaurante", conta o ex-vaqueiro e ex-açougueiro Raimundo Souza Soares, 56.
O Galinhada do Bahia fica em
uma viela em frente ao estádio
da Portuguesa, no Canindé, literalmente no quintal da casa
do Bahia. No "puxadinho", há
espaço e comida farta: galinha
de cabidela, buchada de bode,
feijão tropeiro...
O gosto pela comida também
levou o paraibano Severino Gomes da Silva, o Biu, 59, a montar seu próprio negócio, o Bar
do Biu, em Pinheiros. "Pedi a
conta [de uma empresa de ônibus] para montar meu boteco,
porque a minha vocação era
restaurante. Escutava os amigos mais velhos dizerem que o
melhor era fazer aquilo que a
gente gostava. E o que eu mais
gostava era comer", ri Biu.
Também no bairro de Pinheiros está o Andrade Restaurante. Seu dono, o baiano Manoel Leite de Andrade, 62, está
há 45 anos em São Paulo, dos
quais 25 dedicados à casa de comida nordestina.
De lá, sai aquele que é um
clássico do restaurante: a carne-seca desfiada com macaxeira, jerimum e batata-doce.
"Quando comecei a cozinhar,
decidi desenvolver um trabalho
melhor. Aí, viajei pelo Nordeste, para ver como eram as comidas, como eram feitas."
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