São Paulo, segunda-feira, 07 de setembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

66º FESTIVAL DE VENEZA

Crítica/"Capitalism, a Love Story"

Documentário de Michael Moore é inteligente, manipulador e nada sutil

LEONARDO CRUZ
ENVIADO ESPECIAL A VENEZA

Início da sessão. Uma imagem de arquivo de um homem engravatado e de cabelo engomado aparece na tela, diante de fundo vermelho. Ele diz: "Este filme não pode ser visto por ninguém que tenha problemas cardíacos ou que se irrite facilmente". Na sequência, cenas de assalto a banco, feitas por circuitos internos de TV, com mascarados rendendo clientes e beijando dinheiro -tudo embalado pelo rock de Iggy Pop em "Louie Louie".
Michael Moore está de volta para fazer o que faz melhor, um documentário inteligente, engraçado, manipulador e nada sutil. "Capitalism, a Love Story" (capitalismo, uma história de amor) mostra a relação de amor (e ódio) que os EUA construíram com seu sistema econômico desde o Pós-Guerra. E como as falhas do sistema levaram o mundo à crise em 2008.
O fio condutor do filme é a investigação de Moore no impacto dessa crise nas famílias de média e baixa renda nos EUA. Ele acompanha execuções de ordens de despejo e entrevista pessoas que perderam casas e empregos. Nada muito diferente do que a imprensa mundial já fez, mas com a dose de pimenta habitual do diretor de longas premiados como "Farenheit 11 de Setembro" (2004), sobre a Guerra do Iraque, e "Tiros em Columbine" (2002), sobre a indústria de armas.
Em paralelo à linha mestra, Moore traça um breve histórico da economia dos EUA, destacando que a partir do governo Reagan grandes bancos ganharam mais influência na Casa Branca e que funcionários de grupos como Merryl Lynch e Goldman Sachs assumiram postos de alto escalão.
Esse panorama vem cheio de ironia. Logo no início, Moore usa imagens de um filme histórico sobre a queda do Império Romano intercaladas com cenas da América atual. Mais tarde, mescla um discurso de Bush sobre as virtudes do capitalismo com registros de pessoas comuns procurando emprego.
O sensacionalismo também se apresenta: um ex-funcionário de uma fábrica de portas relembra o dia da demissão. Ele chora, a câmera se aproxima de seus olhos, e o volume da melodramática música de fundo aumenta gradualmente.
Como os longas anteriores, "Capitalism" é um bocado autocentrado. Há várias imagens da infância de Moore para ilustrar a fase áurea da economia, bem como depoimentos do padre que o casou para saber a opinião da Igreja sobre a crise.
Esse recurso não é gratuito e visa ganhar a plateia. Moore se coloca como o homem comum, um Homer Simpson que tenta entender seu país. Somada aos depoimentos dos derrotados e a um final esperançoso, a estratégia funciona.
"Capitalism" é tão fascinante quanto perverso e, claro, deve render alguns milhões de dólares a Michael Moore.


Avaliação: ótimo


Texto Anterior: Andy Warhol e a arca perdida
Próximo Texto: Plantações de soja são tema de reality show
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.