|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
66º FESTIVAL DE VENEZA
Crítica/"Capitalism, a Love Story"
Documentário de Michael Moore é inteligente, manipulador e nada sutil
LEONARDO CRUZ
ENVIADO ESPECIAL A VENEZA
Início da sessão. Uma imagem de arquivo de um homem engravatado e de cabelo engomado aparece na tela,
diante de fundo vermelho. Ele
diz: "Este filme não pode ser
visto por ninguém que tenha
problemas cardíacos ou que se
irrite facilmente". Na sequência, cenas de assalto a banco,
feitas por circuitos internos de
TV, com mascarados rendendo
clientes e beijando dinheiro
-tudo embalado pelo rock de
Iggy Pop em "Louie Louie".
Michael Moore está de volta
para fazer o que faz melhor, um
documentário inteligente, engraçado, manipulador e nada
sutil. "Capitalism, a Love Story"
(capitalismo, uma história de
amor) mostra a relação de
amor (e ódio) que os EUA construíram com seu sistema econômico desde o Pós-Guerra. E
como as falhas do sistema levaram o mundo à crise em 2008.
O fio condutor do filme é a investigação de Moore no impacto dessa crise nas famílias de
média e baixa renda nos EUA.
Ele acompanha execuções de
ordens de despejo e entrevista
pessoas que perderam casas e
empregos. Nada muito diferente do que a imprensa mundial já
fez, mas com a dose de pimenta
habitual do diretor de longas
premiados como "Farenheit 11
de Setembro" (2004), sobre a
Guerra do Iraque, e "Tiros em
Columbine" (2002), sobre a indústria de armas.
Em paralelo à linha mestra,
Moore traça um breve histórico da economia dos EUA, destacando que a partir do governo
Reagan grandes bancos ganharam mais influência na Casa
Branca e que funcionários de
grupos como Merryl Lynch e
Goldman Sachs assumiram
postos de alto escalão.
Esse panorama vem cheio de
ironia. Logo no início, Moore
usa imagens de um filme histórico sobre a queda do Império
Romano intercaladas com cenas da América atual. Mais tarde, mescla um discurso de Bush
sobre as virtudes do capitalismo com registros de pessoas
comuns procurando emprego.
O sensacionalismo também
se apresenta: um ex-funcionário de uma fábrica de portas relembra o dia da demissão. Ele
chora, a câmera se aproxima de
seus olhos, e o volume da melodramática música de fundo aumenta gradualmente.
Como os longas anteriores,
"Capitalism" é um bocado autocentrado. Há várias imagens
da infância de Moore para ilustrar a fase áurea da economia,
bem como depoimentos do padre que o casou para saber a
opinião da Igreja sobre a crise.
Esse recurso não é gratuito e
visa ganhar a plateia. Moore se
coloca como o homem comum,
um Homer Simpson que tenta
entender seu país. Somada aos
depoimentos dos derrotados e
a um final esperançoso, a estratégia funciona.
"Capitalism" é tão fascinante
quanto perverso e, claro, deve
render alguns milhões de dólares a Michael Moore.
Avaliação: ótimo
Texto Anterior: Andy Warhol e a arca perdida Próximo Texto: Plantações de soja são tema de reality show Índice
|