São Paulo, quarta-feira, 08 de maio de 2002

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CINEMA/RÉPLICA

Não li e não gostei

ANDRÉ STURM
ESPECIAL PARA A FOLHA

Existe um paradoxo na Ilustrada. Um dos melhores cadernos culturais do país, que fala sobre os mais variados assuntos e que tem dado excelente cobertura ao cinema brasileiro, em particular. Só nos últimos dois meses, pelo menos quatro capas foram para filmes ainda em produção. Repórteres e críticos viajam para cobrir os principais eventos.
Mas, há cerca de seis meses, surgiu um "especialista" encarregado de fazer "críticas" dos filmes nacionais que estréiam. E o que espanta é a postura desses escritos. Não possuo estatística exata, mas em geral os filmes recebem bola preta ou quatro estrelas.
Filmes unânimes, inatacáveis, recebem cotação máxima. A quase todos os outros resta a bola preta. Por que esse rigor exagerado?
Em março, reparei que havia quatro filmes bola preta -três brasileiros. Parece-me uma desproporção muito grande. O cinema brasileiro não é tão pior que os outros. Como em qualquer cinematografia, há os filmes ótimos, os bons, os razoáveis, os fracos e os péssimos. Por que brasileiros são tratados com maniqueísmo? Têm de ser ótimos, sob a ameaça de serem atirados à vala comum da bola preta. Não se trata de pedir condescendência ou tolerância. Mas tratamento equânime.
O pior é que, não satisfeito com o maniqueísmo na avaliação, esse jornalista tem o hábito de destruir os filmes, seus diretores e as pessoas envolvidas. Grosserias, chacotas, trocadilhos infames e ofensas são marcas registradas.
E o curioso é que ele se dedica exclusivamente ao cinema brasileiro. Por que não "critica" filmes estrangeiros? Seria talvez porque os envolvidos na produção desses filmes não lerão seus escritos e, portanto, ele não atingiria seu objetivo principal, o de incomodar?
Porque só pode ser esse o desejo motor. No dia 26, "Sonhos Tropicais" foi a bola preta da vez. Fui avisado do teor das palavras do "especialista" e, como não tenho vocação para masoquista, não perdi tempo lendo as ofensas dedicadas a meu filme e a mim.
Não vou ocupar esse espaço defendendo minha obra. Diversos jornalistas dedicaram espaço para a análise séria do filme. Mas é hora de dar um basta a essa violência gratuita. Como pode alguém escrever frases como: "É desde já candidato a pior filme do ano" (em janeiro). Ou: "Fulano só não é o pior ator do mundo porque não é ator". Isso para citar duas grosserias de que me lembro de cabeça. Isso não é jornalismo. Humilha pessoas, não informa e não combina com o estilo da Ilustrada, pluralista e democrático.


André Sturm é cineasta e diretor de "Sonhos Tropicais"



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